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Josias de Souza

No perde e ganha do STF, Lava Jato fica parecida com Titanic e Lula se safa

Josias de Souza

23/03/2018 13h13

As coisas poderiam estar mais tranquilas para os ógãos que combatem a corrupção no Brasil, pois o STF já avalizou a prisão após condenação na segunda instância em três oportunidades no ano de 2016, a condenação de Lula mostrou que a lei vale para todos e os larápios ficaram tontos. No entanto, a instância máxima do Judiciário brasileiro não se cansa de dar vexame. Se o Brasil fosse um filme, o enredo seria sobre uma embarcação em apuros (Lava Jato), uma tripulação presunçosa (ministros do STF) e uma imensa pedra de gelo à frente (a revisão da regra sobre a prisão). Tudo muito parecido com Titanic.

Ficou mais difícil exagerar sobre as consequências do desastre depois que o Supremo impediu o TRF-4 de impor sua própria jurisprudência a Lula. Em liminar extravagante, a Suprema Corte proibiu o tribunal de segunda instância de liberar Sergio Moro para expedir a partir de segunda-feira a ordem de prisão contra um ex-presidnete condenado a 12 anos e 1 mês por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Veja abaixo quem ganhou e quem perdeu com a decisão do Supremo.

Quem ganha

– Lula: Até a noite de quinta-feira, o líder máximo do PT era uma prisão esperando para acontecer. A Polícia Federal vinha seguindo sua movimentação à distância. A Agência Brasileira de Inteligência monitorava as redes sociais à procura de eventuais reações. Mas o esquema montado para capturar Lula subiu no telhado. Com azar, o ex-presidente petista comerá o ovo da Páscoa com os netos e voltará à alça e mira das autoridades apenas depois de 4 de abril. Com sorte, prevalecerá no julgamento do mérito do habeas corpus e ganhará do Supremo o direito de recorrer em liberdade contra a condenação no Caso do Tríplex.

– Partido dos Trabalhadores: Preso, Lula levaria o projeto presidencial do PT para trás das grades. Solto, continua inelegível. Mas pode manter a pose de presidenciável em caravanas, entrevistas e eventos partidários. Na pior das hipóteses, a encenação do PT sobrevive até 4 de abril. Na melhor das hipóteses idealizadas pelo partido, o Supremo mantém a carta de Lula no baralho até agosto, quando o TSE terá de descartar o registro de sua candidatura. Quanto mais prolongada for a exposição, maior será a chance de o PT colocar um poste de Lula no segundo turno da sucessão.

– Corruptos e criminalistas: O placar de 6 a 5 a favor da liminar que proibiu a prisão de Lula até 4 de abriu foi um prenúncio de que a regra que permite a prisão na segunda instância está com os dias contados. Os seis ministros que deram o salvo-conduto para Lula são justamente os que querem empurrar a prisão para a terceira instância (STJ) ou para o ponto final do trânsito em julgado (STF). Os condenados presos da Lava Jato farão fila no guichê do habeas corpus. Quanto aos criminalistas, não perdem por esperar. Ganham.

Quem perde

– Lava Jato: É grande o desânimo que se abateu sobre a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, principal vitrine da operação. Em privado, os procuradores da República que integram o grupo compartilham previsões pessimistas sobre o futuro da mais bem sucedida iniciativa anticorrupção da história. O receio é o de que o salvo-conduto concedido a Lula seja a apenas a primeira providência de uma série de decisões que culminarão com a revogação da jurisprudência que autorizou a prisão de corruptos condenados na segunda instância. Nas palavras de um dos procuradores da Lava Jato, a eventual revisão dessa jurisprudência será "a maior derrota da Lava Jato e do esforço para o combate a crimes de poderosos."

– Sergio Moro: O juiz da Lava Jato se equipava para assinar o mandado de prisão de Lula entre segunda e terça-feira. Passaria à história como signatário da ordem que encarcerou o primeiro ex-presidente da história condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A liminar do Supremo retardou o feito para depois de 4 de abril. A espera pode ser maior se a Suprema Corte conceder habeas corpus a Lula. Mais adiante, se a prisão migrar da segunda para a teceira instância (STJ), o juiz terá um verbete mais magro na enciclopédia.

– TRF-4: A 8ª Turma do TRF-4 manteve para segunda-feira a sessão de julgamento do recurso de Lula (embargo de declaração) contra a sentença de 12 anos e 1 mês de cadeia. Mas a liminar do Supremo retirou do julgamento sua consequência mais dramática. Os desembargadores João Pedro Gebran Neto, Leandro Paulsen e Victor Laus não poderão autorizar Sergio Moro a expedir mandado de prisão contra Lula, como pretendiam. Vistos como fantasmas pelos réus da Lava Jato, os três magistrados de Porto Alegre vão virar gasparzinhos se o Supremo retirar da segunda instância do Judiciário o poder de colocar corruptos no caminho do brejo carcerário.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.