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Josias de Souza

Supremo vira ioiô e perde a própria supremacia

Josias de Souza

25/04/2018 20h25

Marcado por suas idas e vindas, o Supremo tornou-se o epicentro de um fenômeno que corroi o prestígio da Justiça brasileira: a insegurança jurídica. A Suprema Corte virou um ioiô. Ora joga a delação da Odebrecht sobre Lula para Sergio Moro, ora manda o material para São Paulo. Num instante, aprova a prisão na segunda instância. Noutro, ameaça rever a novidade. Afasta Eduardo Cunha do mandato e delega ao Senado a palavra final sobre o afastamento de Aécio Neves. Cede poder aos senadores e, depois, ressuscita Demóstenes Torres, devolvendo-lhe direitos políticos que o Senado havia cassado. Nesse vaivém, o Supremo-ioiô perde a própria supremacia.

Há no Brasil uma sólida e inquestionável certeza: o Judiciário é lento, concordam todos, do advogado de porta de cadeia até a presidente do próprio Supremo. Pois na decisão sobre a delação da Odebrecht, três ministros da Segunda Turma —Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes— transferiram provas contra Lula da azeitada engrenagem de Curitiba para a São Paulo, onde a Lava Jato caminha na velocidade de uma lesma tetraplégica. Ofereceram matéria-prima para a defesa de Lula enfileirar recursos, embargos e todo tipo de petições contra decisões de Sergio Moro.

Poucas vezes o Brasil teve um Supremo tão desatento com suas responsabilidades institucionais. Há de tudo na Suprema Corte —de ministro reprovado em concurso para juiz até magistrado que mantém negócio privado. Decisões colegiadas são solenemente desrespeitadas. Há na prática não um, mas 14 supremos: os 11 ministros, as duas turmas e o plenário da Corte. O Brasil perdeu as esperanças de ter no topo do sistema judicial um tribunal que seja Supremo. Mas merece ter pelo menos um Supremo que tenha lógica.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.