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Josias de Souza

Eleitor zangado favorece oligarquia no Tocantins

Josias de Souza

04/06/2018 04h36

A disputa pelo posto de governador-tampão do Tocantins deu visibilidade aos dois fantasmas que assombram a sucessão presidencial de 2018: a fúria e o desalento do eleitor. Somando-se a legião que se absteve de comparecer às urnas tocantinenses com a multidão que anulou o voto ou votou em branco, chega-se quase à metade do eleitorado (49,33%) do Estado. A zanga e o desalento saíram pela culatra. Ao lavar as mãos, o eleitor favoreceu a oligarquia partidária que faz sumir o sabonete.

Foram para o segundo turno o atual governador interino do Tocantins, Mauro Carlesse, e o senador Vicentinho Alves. O primeiro é filiado ao PHS, partido que acompanhou Eduardo Cunha até a porta da cadeia. O segundo pertence aos quadros do PR, legenda controlada como um cartório pelo ex-presidiário do mensalão Valdemar Costa Neto.

Carlesse foi agraciado com a preferência de 174.275 eleitores (30,31% dos votos válidos). Vicentinho obteve 127.758 votos (22,22%). Juntos, amealharam 302.033 votos —uma quantidade muito inferior aos 443.414 votos que a turma que faz cara de nojo se recusou a entregar para um dos candidatos. E não se pode nem alegar que foi por falta de opção.

Neste primeiro turno, o rol de candidatos ao governo-tampão incluía o ex-juiz Márlon Reis (Rede-TO), idealizador da Lei da Ficha Limpa. Mal comparando, Márlon esteve para a disputa do Tocantins como o ex-presidente do Supremo Joaquim Barbosa estaria para a eleição presidencial se não tivesse desistido.

Dizer que Márlon seria um bom governador exigiria um exercício tolo de adivinhação. Mas é imperioso reconhecer: numa eleição emergencial, convocada em consequência da cassação de Marcelo Miranda, um governador que fizera campanha com verbas sujas, o mentor da Lei da Ficha Limpa representava uma opção para o eleitor que quisesse quebrar o jogo viciado da disputa política.

Pois Márlon, com 9,91% dos votos válidos, amargou um constrangedor quinto lugar. Além dos dois contendores que foram ao segundo turno, o ex-juiz da Ficha Limpa foi superado pelo terceiro colocado, Carlos Amastha (PSB), com 21,41%. Perdeu também para Kátia Abreu (PDT), que, mesmo dispondo do apoio do presidiário Lula, angariou apenas 15,66% dos votos válidos.

Mauro Carlesse, o mais votado do Tocantins, é um colecionador de processos judiciais. Aliou-se ao ex-governador Siqueira Campos (DEM), outro detentor de volumosa ficha corrida. Vicentinho Alves, o segundo mais votado, é apoiado pelo MDB, partido do ex-governador Marcelo Miranda, cuja cassação provocou a eleição emergencial.

As pesquisas eleitorais sinalizam que, nos cenários mais prováveis, a disputa presidencial também vem sendo assombrada por um percentual de eleitores sem candidato acima dos 30%. O caso do Tocantins não é um bom exemplo. Mas constitui um ótimo aviso. Em tempos de caminhonaço, a fúria do eleitorado produz muita filosofia de parachoque. Mas convém levar em conta que, a partir de janeiro de 2019, nada substituirá o próprio parachoque.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.