Topo

Josias de Souza

CPI que mira a Lava Jato pode parar na Justiça

Josias de Souza

21/06/2018 02h00

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), recebeu três reclamações por escrito contra a instalação da CPI sobre as delações da Lava Jato. As queixas são chamadas tecnicamente de "questões de ordem". Os signatários são deputados que subscreveram o pedido de CPI e agora alegam que foram ludibriados, pois a Lava Jato, que não constava do cabeçalho do requerimento original, foi inserida depois da coleta das assinaturas dos apoiadores. A lambança pode parar na Justiça.

"Se for necessário, recorreremos à Justiça", disse ao blog o deputado Júlio Delgado (PSB-MG). "Vamos aguardar a resposta do presidente Rodrigo Maia às questões de ordem. Assinamos uma coisa, sem Lava Jato. E saiu publicado outra coisa, com Lava Jato. Fomos induzidos ao erro. A Justiça evidentemente determinará a retirada das assinaturas. Essa CPI não vai prosperar."

A CPI foi proposta pelo líder do PT, deputado Paulo Pimenta (RS). Os dois documentos reproduzidos abaixo ajudam a entender a encrenca. O primeiro foi exibido aos deputados no momento da coleta das assinaturas dos supostos apoiadores da inciativa. Repare que o cabeçalho do pedido de CPI não cita a Lava Jato. O segundo documento, extraído dos computadores da Câmara, exibe a reprodução do cabeçalho do texto que foi encaminhado a Rodrigo Maia. Nele, a Lava Jato é explicitamente mencionada como alvo da CPI.

Sem Lava Jato: cabeçalho do requerimento usado na coleta de assinaturas dos "apoiadores" da CPI

Com Lava Jato: cabeçalho do requerimento de CPI publicado no sistema eletrônico da Câmara

O deputado Rubens Bueno (PPS-PR) aponta um segundo problema. O cabeçalho do requerimento original da CPI, lido pelos deputados que assinaram o documento, anota que o objetivo da investigação parlamentar seria "investigar denúncias de irregularidades feitas contra Antonio Figueiredo Basto e outros, inclusive envolvendo escritório de advocacia, ocorridos no âmbito de alguns processos de delação." Especialista em delações, o advogado Figueiredo Basto foi acusado de vender proteção a doleiros por US$ 50 mil mensais. Ele nega a acusação.

Pois bem, o deputado Bueno observou que o texto da justificativa do pedido acrescenta que "o objeto da CPI deverá estender-se, por conexão, para ocorrência de irregularidades em sede de outras investigações…" Bueno subiu no caixote: "É evidente que os signatários do requerimento foram induzidos a erro pela ementa [cabeçalho], que não inclui os fatos conexos. A inclusão da expressão 'por conexão' no meio do requerimento da CPI, e não na ementa, foi maliciosa e pretende ampliar a apuração de fatos não determinados na lista de recolhimento de assinaturas."

O pedido de CPI foi protocolado junto à Mesa Diretora da Câmara com 190 assinaturas, 19 além dos 171 apoios exigidos pelo regimento. O bloco dos engabelados tentou retirar as assinaturas. A essa altura, contudo, a CPI só pode ser desconvocada por meio de requerimento assinado por pelo menos 96 apoiadores arrependidos. Recolheram-se apenas 82 rubricas. Mesmo faltando 14 assinaturas, o documento foi encaminhado a Rodrigo Maia. O PT cobra a instalação da CPI.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.