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Josias de Souza

Envio de Richa para gavetão eleitoral é escárnio

Josias de Souza

25/06/2018 19h03

É dura a vida da plateia. O tucanato paranaense de Beto Richa é apanhado com uma gorjeta de R$ 4 milhões da Odebrecht e o Superior Tribunal de Justiça resolve transferir a encrenca da mesa de Sergio Moro para o gavetão das pendências eleitorais. É mais do que uma tentativa de blindagem. Trata-se de um escárnio.

O dinheiro saiu do Departamento de Operações Estruturadas da Odebrecht, eufemismo para setor de propinas. Transitou por contas bancárias no exterior. Delatores da empreiteira informam que a verba destinou-se a fraudar a concorrência para a duplicação de uma rodovia estadual, a PR 323.

Além de delações, há no inquérito a gravação de uma conversa vadia. No despacho em que cumpriu a determinação de enviar o material à Justiça Eleitoral, Sergio Moro escreveu: "Há indícios de que o caso não consiste em doações eleitorais não registradas, mas sim em possível crime de corrupção."

O juiz da Lava Jato enfatizou: "Não se trata de 'mero caixa dois' de campanha, mas sim, de […] pagamento de vantagens financeiras por solicitação de agente público, no caso, o ex-chefe de Gabinete do então governador, em troca da prática ou da omissão de ato de ofício."

No plano político, Beto Richa conta com a complacência solidária do seu partido, o PSDB. Na seara jurídica, usufruiu do escudo do foro privilegiado enquanto esteve na poltrona de governador. Em abril, deixou o governo para disputar uma vaga no Senado.

Quando todos imaginavam que Richa cairia, finalmente, no colo da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, descobre-se que o grão-tucano, a exemplo do que já sucedera com Geraldo Alckmin, migrou do escaninho da corrupção para a gaveta do caixa dois. Num, chega-se à cadeia. Noutra, à blindagem.

Se o dinheiro que foi para as arcas paranaenses do tucanato tivesse saído do bolso de Richa, tudo bem. Se a origem da verba fosse um depósito proveniente da conta pessoal de Marcelo Odebrecht, sem favores do Estado à empreiteira, tudo não passaria de uma ação entre amigos. O diabo é que o jabaculê saiu do bolso dos contribuintes em dia com a Receita Federal e com o fisco estadual.

Logo, logo os outros partidos exigirão a organização de um seminário para que os tucanos expliquem as mumunhas que conduzem os seus escândalos à porta de emergência da Justiça Eleitoral.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.