Marta desce do palco da pior forma: sem votos
Marta Suplicy anunciou três decisões nesta sexta-feira: 1) Não será candidata a vice na chapa presidencial de Henrique '1%' Meirelles; 2) Não disputará a reeleição para o Senado; 3) Desfiliou-se do MDB.
Marta divulgou uma "carta aos paulistas". Nela, criticou os partidos políticos, condenou o toma lá dá cá que rege a ocupação predatória de cargos no Executivo e atacou o conservadorismo do Congresso na área dos costumes.
Quem lê a carta de Marta, disponível no rodapé deste post, fica com a impressão de que a autora desejou fazer uma pose de navio que abandona os ratos. Mas a verdade é que Marta não abandonou, foi abandonada… pelo eleitor.
Marta exerceu na plenitude a prerrogativa de escolher o seu próprio caminho rumo ao ocaso. Numa entrevista concedida em janeiro de 2015, a então senadora do PT declarou: "Cada vez que abro um jornal, fico mais estarrecida com os desmandos do que no dia anterior. É esse o partido que ajudei a criar e fundar?".
Dez anos depois do estouro do mensalão, com o petrolão a pino, Marta se dava conta de que aquele PT que ajudara a criar convertera-se numa máquina arrecadadora de dinheiro sujo. Pois bem. O que fez Marta?
Oito meses depois da caída em si, a senadora filiou-se ao (P)MDB —um partido que deseja "livrar o Brasil da corrupção e da mentira", discursou Marta na cerimônia organizada para recepcioná-la. Prestigiaram o ato, entre outras figuras tóxicas, Eduardo Cunha, Renan Calheiros e Michel Temer.
Cunha, Renan e Temer já não eram bons exemplos. Mas eram ótimos avisos. "A gente quer um Brasil livre da corrupção e das mentiras, livre daqueles que usam a política como meio de obter vantagens pessoais", Marta insistiu. "Afinal, eu estou no PMDB do doutor Ulysses…"
Marta fingia não notar. Mas o PMDB de Ulysses Guimarães morrera afogado nas águas frias de Angra dos Reis em outubro de 1992. E seus restos mortais jamais foram localizados.
Considerando-se todas as circunstâncias, não é tão difícil de entender por que Marta Suplicy optou por descer do palco congressual. A carta da senadora, com seus oito parágrafos, é apenas um caminho muito longo para dizer algo que poderia ser resumido em duas palavras: "Faltam-me votos". E não se pode culpar o eleitor por sinalizar nas pesquisas a intenção de aposentar Marta do Senado.
Vai abaixo a integra da carta de Marta Suplicy:
Muitas vezes, vi-me em tempos de travessia. Em alguns deles, acreditei ter luzes no outro lado do rio. Agora, com toda a energia necessária para continuar remando, tomei a decisão sobre o futuro da minha vida política, encarando a realidade de frente, para poder seguir com coerência, ousadia e coragem.
Anuncio que não concorrerei à reeleição a senadora da República pelo Estado de São Paulo e comunico a minha desfiliação do Movimento Democrático Brasileiro (MDB).
Não é novidade que os partidos políticos brasileiros, de forma geral, encontram-se fragilizados, acuados e sem norte político. Não mais conseguem dar respostas à crise de credibilidade que se abateu sobre eles e nem tampouco estão empenhados na mudança de posturas que os levaram à mais grave crise de suas histórias. Orientam suas movimentações políticas pela lógica exclusiva de fazerem crescer suas bancadas parlamentares com o objetivo perverso e mesquinho de fortalecerem-se na divisão e loteamento de cargos e espaços de poder.
A relação de grande parte dos partidos e de parlamentares com o Executivo na base de nomeações e vantagens levou ao insuportável "toma lá dá cá", afrontando todos os padrões de dignidade e honradez da sociedade. Esse sistema faliu e precisa ser, urgentemente, reformado.
O Congresso Nacional, hoje, na sua maioria, não tem se colocado a favor das causas progressistas, fundamentais para o avanço da sociedade. Ao contrário, tornou-se refém de uma agenda atrasada dos costumes da sociedade, negando-se a reconhecer e a regulamentar as relações entre as pessoas de forma a contemplar as diversidades das sociedades modernas e a respeitar os direitos individuais do ser humano.
Quero agradecer aos 8,3 milhões de paulistas que me deram a oportunidade de, nos últimos 8 anos, trabalhar como senadora defendendo as bandeiras que me levaram à vida pública: o combate às desigualdades e às injustiças sociais, a militância pelos direitos de cidadania das mulheres e da população LGBTI e pela igualdade de oportunidades para todos.
Neste momento, creio que poderei contribuir mais para mudanças atuando na sociedade civil do que continuando no parlamento. Permanecerei participando politicamente da vida pública brasileira. A partir de 2019, não mais como parlamentar, mas em todas as trincheiras que me levem ao lado da defesa dos interesses dos mais pobres, dos injustiçados e na luta pelo empoderamento das meninas e das mulheres.
Estou convencida de que o Brasil precisa de um projeto nacional de desenvolvimento estruturado que abranja setores fundamentais para o crescimento do país. Temos de aumentar, significativamente, a produção e a riqueza. Isso possibilitará todo brasileiro e toda brasileira terem educação de qualidade, saúde, segurança e um emprego para trabalhar e viver com dignidade.
São Paulo, 03 de agosto de 2018.
Senadora Marta Suplicy
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