Topo

Josias de Souza

Lewandowski descobre vocação para sindicalista

Josias de Souza

10/08/2018 15h14

O ministro Ricardo Lewandowski se autoconverteu em presidente do sindicato dos magistrados. Nessa posição, sentiu-se à vontade para justificar o pedido de reajuste salarial de 16,38% para os ministros do Supremo. Insinuou que a Lava Jato resolveu o problema de caixa: "Vocês repararam que os juízes de Curitiba devolveram R$ 1 bilhão de dinheiro desviado da Petrobras?" Realçou que a cifra supera o custo estimado da tonificação dos contracheques dos juízes: R$ 780 milhões anuais

A insinuação de Lewandowski ofende a inteligência alheia, pois ignora princípios elementares das finanças e da aritmética. A verba da folha sai das arcas do Tesouro, que não se confudem com os cofres da Petrobras. A devolução à estatal do dinheiro que lhe fora roubado é um repasse único. O reajuste cria uma despesa eterna. Para complicar, escorre pelo organograma do Estado, num efeito cascata que engordará a folha em mais de 4 R$ bilhões por ano. A água já começou a de$cer. E a União,  quebrada, não dispõe dessa verba.

Considerando-se que o brasileiro paga tributos europeus para receber serviços públicos africanos, Lewandowski comporta-se mais ou menos como Diógenes de Sinope, filósofo grego a quem se atribui a estruturação do movimento filosófico batizado de "cinismo". Alexandre, o Grande, com poderes tão supremos quanto os que Lewandowski julga possuir, perguntou a Diógenes o que poderia fazer por ele. E o sábio: "Posicione-se um pouco menos entre mim e o Sol."

A diferença entre Lewandowski e Diógenes é que o neo-sindicalista da Suprema Corte brasileira alcançou um inédito grau de sofisticação filosófica. Inaugurou a era do pós-cinismo. Na Segunda Turma do Supremo, Lewandowski ajuda a colocar em prática a política de celas abertas. É visto como um adversário do esforço anticorrupção. Mas não se constrange de encostar suas pretensões salariais no êxito da Lava Jato.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.