Topo

Josias de Souza

Passada anestesia do Mais Médicos, vem a dor

Josias de Souza

21/11/2018 22h38

Alguém já disse, não me lembro quem, que se o Brasil fosse um deserto, já estaria importando areia. Mal comparando, é mais ou menos isso o que aconteceu no caso dos médicos. Sobram médicos no Brasil como sobra areia no Saara. Mas o país decidiu importar médicos estrangeiros em 2013, sob Dilma Rousseff. Tratou anestesia como solução. Passado o efeito do sedativo, vem a dor.

Nos próximos dias, o noticiário será inundado por dramas de pacientes que perderam seus médicos do dia para a noite. Doentes sem diagnóstico, diagnosticados sem tratamento, grávidas submetidas à interrupção abrupta do pré-natal, o diabo. Isso não é previsão. Já está acontecendo em vários municípios, que perderam seus médicos. Num estalar de dedos da ditadura de Cuba, os cubanos estão voltando para Havana.

O curto-circuito que a chegada de Jair Bolsonaro provocou no Mais Médicos revela que a ideologia é mesmo o caminho mais longo entre um projeto e sua realização. Ao receber um xeque-mate de Cuba, o Brasil faz por pressão o que deixou de fazer por opção. Sem planejamento, o Ministério da Saúde abriu 8.500 vagas para médicos brasileiros. O site de recrutamento entrou em pane no primeiro dia. Tudo é correria e improviso.

Estudo feito pela Faculdade de Medicina da USP revelou que há no Brasil 452 mil médicos. Seria mais do que suficiente. Mas 63% deles estão nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste. E 55%, encontram-se nas capitais. Num aperto, uma parte desse contingente pode até se deslocar para os fundões do Brasil, de onde estão saindo os cubanos. Mas o improviso não é o melhor estímulo para que eles fiquem lá.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.