Irresponsabilidade fiscal domina 85% da Câmara
Num instante em que a conjuntura pede austeridade, a Câmara revelou que o maior déficit do Estado localiza-se mesmo entre as orelhas dos agentes políticos. Na sessão desta quarta-feira, havia em plenário 352 deputados. Foi a voto um projeto que rasga a Lei de Responsabilidade Fiscal nos trechos que impõem sanções aos prefeitos que gastarem mais de 60% da receita com salários. A coisa foi aprovada por um placar avassalador: 300 votos a 46, com cinco abstenções. Repetindo: 85,5% dos presentes autorizaram uma megapedalada fiscal. Apenas 13,1% dos votantes disseram "não" ao despautério. Rodrigo Maia, presidente da sessão, não votou. (veja aqui a íntegra da lista de votação.)
Hoje, se um prefeito fura o teto fixado para os gastos com a folha, a lei o obriga a regularizar o caixa em oito meses. Do contrário, a cidade deixa de receber verbas federais e vai para um limbo onde o acesso a operações de crédito é vedado. Pelo projeto, prefeituras que amargarem perda de arrecadação superior a 10% ficarão desobrigadas de respeitar o teto salarial de 60%. Se quiserem, os prefeitos podem até contratar mais servidores. Considerando-se que a folha já subiu no telhado em 80% dos municípios, os deputados namoram um desastre. E serão correspondidos.
A encrenca já havia passado pelo Senado. Avalizada pela Câmara, seguiu para a sanção de Michel Temer. Se quisesse, ele poderia vetar a proposta. Mas um presidente que acaba de sancionar o reajuste salarial de 16,38% para os ministros do Supremo, com um efeito cascata orçado em R$ 4 bilhões, não parece estar muito preocupado com a sanidade do erário. Seu partido, o MDB, estava representado na sessão por 37 deputados. Apenas seis votaram contra a megapedalada municipal. O líder Baleia Rossi (SP) escondeu-se atrás da abstenção.
A liderança do PSDB encaminhou contra o projeto. Entretanto, dos 22 tucanos que se encontavam em plenário, nove votaram a favor do desrespeito à responsabilidade fiscal, um princípio que virou lei justamente no governo do grão-mestre do tucanato Fernando Henrique Cardoso. Entre os que rasgaram a lei estavam os líderes da bancada —o atual, Nilson Leitão (MT), e o que assumirá o posto em fevereiro, Carlos Sampaio (SP).
No gogó, a liderança do PSL, partido de Jair Bolsonaro, também recomendou a rejeição do projeto. Mas dos três deputados da legenda que registraram presença, um votou a favor: o Major Olímpio (SP). Logo ele, que acaba de obter nas urnas de outubro um mandato de senador.
A bancada do PT mostrou que não aprendeu nada com a economia criativa que custou o mandato de Dilma Rousseff. Ou, por outra, os petistas provaram que é errando que se aprende… a errar. Todos os 46 deputados que compunham a bancada da estrela vermelha no plenário votaram a favor do vale-tudo fiscal nos municípios. Foi como se os petistas encontrassem na irresponsabilidade fiscal um inédito fator de união partidária.
Outras bancadas atingiram a marca de 100% de falta de compromisso com a rigidez fiscal. Entre elas Solidariedade, PR, PSOL, PCdoB e PDT. Restou demonstrado, uma vez mais, que a insensatez não tem ideologia.
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