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Josias de Souza

‘Poderosos usam instituições para se proteger’, afirma autor da CPI da Toga

Josias de Souza

19/03/2019 01h54

Autor do pedido de abertura da CPI batizada de Lava Toga, o senador Alessandro Vieira (PPS-SE) contesta a alegação de que a investigação parlamentar dos tribunais superiores produziria uma crise institucional. "Não há ameaça aos poderes. Há poderosos que se sentem ameaçados. Eles estão usando as instituições para se proteger, disse o senador, em entrevista ao blog.

Delegado civil, Vieira exerce seu primeiro mandato. Ele protocolará o requerimento de abertura da CPI na Mesa diretora do Senado nesta terça-feira. O documento relaciona 13 fatos a serem investigados. Estão entre os alvos três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF): Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Luiz Fux. A lista inclui também ministros do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Vai abaixo a entrevista:

— O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, sinaliza a intenção de não instalar a CPI. No sábado, ele esteve num almoço com a presença do presidente do Supremo, Dias Tofolli. Acha que Alcolumbre pode criar embaraços para barrar a CPI? Não recebi nenhuma informação de que o presidente Davi trabalharia contra a CPI. O compromisso que ele tem é o de seguir o regimento. Se os requisitos regimentais estiverem atendidos, não há o que fazer além de garantir o direito da minoria de instalar a CPI. Esse direito não depende da vontade da maioria, do governo ou de quem quer que seja. A CPI é um instrumento constitucional necessário e indispensável para fazer determinadas apurações.

— Acha possível realizar a CPI sem crise institucional? Tenho absoluta certeza disso. O Brasil é um país que já teve o impeachment de dois presidentes, o ex-presidente mais popular da história está preso, outro ex-presidente enfrentou duas apurações sobre corrupção durante o exercício do mandato, o atual presidente da República foi esfaqueado durante a campanha, temos um ex-presidente da Câmara cassado e preso. Temos tudo isso e a democracia continua funcionando normalmente. Não há ameaça aos poderes. Há poderosos que se sentem ameaçados. Estão usando as instituições para se proteger.

— Como analisa o crescimento das críticas ao Judiciário? Você tem hoje nas ruas, até por falta de informação, uma demanda por providências extremas. Fala-se, por exemplo, em acabar com o STF. O que nós estamos pretendendo é exatamente o contrário. Estamos defendendo a aplicação dos remédios previstos na nossa Constituição. Ninguém é contra Judiciário. Ninguém quer nada fora do que está previsto em lei. Deseja-se que a lei seja cumprida.  

— Onde se pretende chegar com a CPI? Queremos fazer uma avaliação transparente do funcionamento das Cortes superiores, para identificar problemas que podem ser chamados de operacionais —a falta de algo estrutural, por exemplo. Ao mesmo tempo, queremos identificar e elucidar fatos concretos praticados por indivíduos. Esses fatos podem configurar a prática de crimes, inclusive o crime de responsabilidade. Para as deficiências operacionais, podem ser apresentados projetos que as corrijam. Para o crime de responsabilidade, se ficar configurado, o passo seguinte seria a abertura de processo de impeachment.

— O pedido de CPI menciona 13 fatos. A constituição de uma CPI não exige um fato determinado? Não existe nenhum tipo de restrição a número de fatos. Isso já foi tratado pelo próprio Supremo. Nós temos que elencar os fatos. E os 13 fatos que nós elencamos estão perfeitamente delineados. Nada impede, inclusive, que surjam outros fatos conexos durante o andamento da CPI.

— A que se referem os 13 tópicos da CPI? Há cinco tópicos referentes ao ministro Gilmar Mendes, dois relacionados ao ministro Dias Toffoli e um relativo ao ministro Luiz Fux. Há também casos envolvendo ministros do STJ. E temos uma situação que envolve ministros do TST. O objeto da CPI são os tribunais superiores.

— A CPI não vai tratar da investigação aberta por Dias Toffoli para apurar supostas ameaças a ministros do Supremo? Esse caso não está mencionado, porque foi posterior à preparação do requerimento da CPI. Essa investigação aberta pelo ministro Toffoli não tem previsão legal. É o AI-5 do Supremo. Foi decretada a ditadura da toga. Eu faço o que eu quero, investigo o que eu quero, respondo a quem eu quero. E você fique aí, no seu lugar, esperando para ver se vai chegar a sua vez.

— O pedido de CPI traz 28 assinaturas, apenas uma além do necessário. Não receia que senadores recuem e retirem o apoio que deram à CPI, como já ocorreu no mês passado? Há sempre essa possibilidade. O senador está submetido à própria consciência e ao eleitorado dele. Responde a essas duas vozes. Não posso controlar. Todos sabem perfeitamente o que assinaram. Os 81 senadores receberam o requerimento nos seus gabinetes, com todas as explicações. Todos os que assinaram e os que se recusaram a assinar sabiam o que estavam fazendo. A partir daí, tenho que confiar na responsabilidade de quem assinou.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.