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Josias de Souza

Moro para Maia: ‘Povo não aguenta mais o crime’

Josias de Souza

20/03/2019 21h41

Normalmente comedido, o ministro Sergio Moro (Justiça) perdeu a calma com o presidente da Câmara. Além de retardar a tramitação do pacote anticrime de Moro, Maia declarou que o texto não passa de um "copia e cola" de outra proposta que já tramita na Câmara, de autoria do ministro do STF Alexandre de Moraes. O deputado desdenhou do pedido de urgência de Moro, a quem chamou de "funcionário do presidente Jair Bolsonaro." Moro respondeu que seu projeto é "inovador e amplo". Reiterou que tem pressa. E insinuou que a sociedade está do seu lado: "Talvez alguns entendam que o combate ao crime pode ser adiado indefinidamente, mas o povo brasileiro não aguenta mais."

Moro responde a Maia e pede urgência em tramitação de pacote anticrime

UOL Notícias

Moro esteve na Câmara nesta quarta-feira. Participou da instalação da Frente Parlamentar de Segurança Pública. E voltou a pedir urgência na tramitação do seu pacote anticrime: "Na minha avaliação, isso (o pacote anticrime) pode tramitar em conjunto (com a reforma da Previdência), não haveria maiores problemas. Mas vamos conversar, estamos abertos ao diálogo. Evidentemente, as decisões relativas ao Congresso pertencem ao Congresso."

Na semana passada, Maia enviara o embrulho de Moro para um grupo de trabalho, que terá 90 dias para compatibilizar a o texto do ministro com outros que já tramitam na Câmara, entre eles o de Alexandre de Moraes. Indagado sobre a manifestação de Moro, o presidente da Câmara fez uma declaração ácida, insinuando que prefere se entender com o chefe do ministro:

"O funcionário do presidente Bolsonaro? Ele conversa com o presidente Bolsonaro e se o presidente Bolsonaro quiser ele conversa comigo. Eu fiz aquilo que eu acho correto. O projeto [de Moro] é importante. Aliás, ele está copiando o projeto direto do ministro Alexandre de Moraes. É um copia e cola. Não tem nenhuma novidade, poucas novidades no projeto dele."

Em resposta, Moro disse ter apresentado seu pacote "em nome do governo do presidente Jair Bolsonaro". Negou tratar-se de um mero exercício de "copia e cola". E injetou a corrupção em sua prosa. Trata-se de "um projeto de lei inovador e amplo contra crime organizado, contra crimes violentos e corrupção, flagelos contra o povo brasileiro."

Em privado, Maia disse a deputados que chateou-se com mensagens que recebeu de Moro pelo celular, na madrugada desta quarta. Nessa versão, o ministro teria cobrado celeridade na votação do seu pacote, insinuando uma hipotética quebra de acordo. Na versão de Maia, o entendimento que prevalece é o de priorizar a tramitação da reforma da Previdência. Algo que conta com a concordância de Bolsonaro.

Moro repisou na visita à Câmara a tecla da urgência: "A única expectativa que tenho, atendendo aos anseios da sociedade contra o crime, é que o projeto tramite regularmente e seja debatido e aprimorado pelo Congresso Nacional com a urgência que o caso requer."

O ministro insinuou que Maia trafega na contramão do interesse social: "Talvez alguns entendam que o combate ao crime pode ser adiado indefinidamente, mas o povo brasileiro não aguenta mais."

De resto, o ex-juiz da Lava Jato disse esperar um tratamento respeitoso de Maia. "Essas questões sempre foram tratadas com respeito e cordialidade com o presidente da Câmara, e espero que o mesmo possa ocorrer com o projeto e com quem o propôs. Não por questões pessoais, mas por respeito ao cargo e ao amplo desejo do povo brasileiro de viver em um país menos corrupto e mais seguro. Que Deus abençoe essa grande nação."

O problema de Moro é que o Planalto não pega em lanças por seu pacote de medidas anticrime e anticorrupção. Conforma já noticiado aqui, o governo dá preferência à Previdência. E trata as propostas de Moro a golpes de barriga.

Leia abaixo a íntegra da manifestação de Sergio Moro:

Sobre as declarações do Presidente da Câmara, Rodrigo Maia, esclareço que apresentei, em nome do Governo do presidente Jair Bolsonaro, um projeto de lei inovador e amplo contra crime organizado, contra crimes violentos e corrupção, flagelos contra o povo brasileiro.

A única expectativa que tenho, atendendo aos anseios da sociedade contra o crime, é que o projeto tramite regularmente e seja debatido e aprimorado pelo Congresso Nacional com a urgência que o caso requer. Talvez alguns entendam que o combate ao crime pode ser adiado indefinidamente, mas o povo brasileiro não aguenta mais.

Essas questões sempre foram tratadas com respeito e cordialidade com o Presidente da Câmara, e espero que o mesmo possa ocorrer com o projeto e com quem o propôs. Não por questões pessoais, mas por respeito ao cargo e ao amplo desejo do povo brasileiro de viver em um país menos corrupto e mais seguro. Que Deus abençoe essa grande nação."

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.