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Josias de Souza

Bolsonaro imita Dilma ao brecar reajuste do diesel

Josias de Souza

12/04/2019 04h01

Jair Bolsonaro teve um surto à moda de Dilma Rousseff. Mandou brecar à noite um reajuste no preço do diesel que a Petrobras anunciara durante o dia. Coisa de 5,7%. A nova cotação, que vigoraria nesta sexta-feira, chegou a ser anotada na tabela exibida no site da estatal. Mas o Planalto mandou passar uma borracha. Caminhoneiros celebraram em grupos de WhatsApp a intervenção de Bolsonaro.

Sob Dilma, o Brasil descobriu que o populismo governamental com o preço dos combustíveis é como fábula de gênio. Há mil histórias de gente tirando o gênio da garrafa. Mas não há nenhuma de gente obrigando o gênio a entrar de novo. Nas gestões petistas, o represamento dos reajustes forçou a Petrobras a absorver o custo. A estatal por vezes importou óleo mais caro do que vendia.

Associado à roubalheira, o represamento dos preços levou a Petrobras à breca sem evitar a inflação. Sob Michel Temer, abriram-se as comportas dos reajustes em periodicidade diária. O gênio não quis voltar para a garrafa. Sobreveio a greve de caminhoneiros, que impôs ao país uma rotina venezuelana.

De joelhos, Temer injetou subsídio na bomba. Mas o aditivo terminou junto com o seu mandato. Com a chegada de Bolsonaro, os preços passaram a subir a cada sete dias. Em março, o Planalto farejou uma insatisfação dos caminhoneiros. O cheiro era de greve. A Petrobras esticou para 15 dias o intervalo entre um reajuste e outro.

O aumento desta sexta-feira chegaria 20 dias depois do anterior. Ao ordenar a meia-volta Bolsonaro potencializou o 'efeito gênio da garrafa'. Há outras formas de reduzir as cotações do combustível. Nenhuma delas conduz à perfeição. Mas é melhor correr o risco de cometer erros novos do que reincidir num erro velho.

No livro 'A Prisioneira', Proust anotou: "Habitualmente detestamos o que nos é semelhante e nossos próprios defeitos vistos de fora nos exasperam." A inabilidade política de Bolsonaro já havia conferido ao capitão uma aparência de Dilma com o sinal trocado. A intervenção na Petrobras leva a semelhança para o campo econômico. Resta saber o que o liberal Paulo Guedes acha da novidade.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.