Topo

Josias de Souza

Lula X Moro: adiamento evita precipitação do STF

Josias de Souza

24/06/2019 12h55

Foi Rui Barbosa quem ensinou: "A justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta." Entretanto, nada poderia ser mais apropriado no momento do que adiar o julgamento do pedido de suspeição formulado pela defesa de Lula contra Sergio Moro. Dependendo da decisão, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal pode anular a sentença do caso tríplex, soltar Lula e ferir de morte a Lava Jato. E a morte é uma coisa que sempre pode ser deixada para depois.

O julgamento, na verdade, já começou. Foi interrompido em dezembro por um pedido de vista de Gilmar Mendes. Dois dos cinco ministros da Segunda Turma —Edson Fachin e Cármen Lúcia— até já proferiram seus votos. Ambos contra as pretensões de Lula. Falta colher os votos de Gilmar, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello. Os dois primeiros empatariam o jogo. Caberia ao decano desempatar.

Gilmar não cogitava devolver a encrenca à pauta antes do segundo semestre. Adiantou o relógio depois que vieram à luz as primeiras mensagens que Moro trocou com Deltan Dallagnol no escurinho do Telegram. Em nova petição, os advogados de Lula empurraram as mensagens tóxicas para dentro dos autos.

Inicialmente, a defesa alegara que a migração de Moro da 13ª Vara Federal de Curitiba para a Esplanada confirmara o viés político das decisões do ex-juiz. Sustenta agora que as mensagens arrancadas do aplicativo confirmam a alegada falta de isenção do ex-magistrado. Ao farejar o cheiro de queimado, Moro e a força-tarefa de Curitiba deflagraram uma tática de redução de danos.  

Chegou-se à seguinte encruzilhada: antes de decidir se Moro foi parcial e se Lula é um injustiçado, as togas terão de informar se as mensagens podem ou não ser admitidas como prova. Para Gilmar Mendes, a origem ilícita de uma prova não impede que seja usada em benefício de condenado sem culpa. O diabo é que Moro e os procuradores injetaram no tabuleiro um elemento novo: a dúvida. Passaram a alegar que as mensagens podem ter sido adulteradas.

Quer dizer: o Supremo agora precisa decidir duas questões preliminares antes de entrar no mérito da causa: 1) Prova obtida de forma criminosa vale?; 2) Se valer, o lote de mensagens pode ser tomado como autêntico sem uma perícia capaz de afastar a alegada hipótese de adulteração? Para complicar, os textos chegam às manchetes em ritmo de conta-gotas. Julgar num ambiente assim seria algo tão seguro quanto sapatear sobre a areia movediça.

Melhor adiar do que cometer o crime da precipitação. O Supremo nunca teve pressa para julgar os réus da Lava Jato que desfrutam do privilégio do foro especial. Condenou um mísero e escasso denunciado. Não seria razoável que resolvesse apressar o passo justamente na apreciação de um habeas corpus que pode resultar na absolvição duvidosa de Lula —um corrupto de terceira instância, cuja prisão foi avalizada pela maioria do plenário do próprio Supremo.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.