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Josias de Souza

PEC da prisão não passa no plenário da Câmara

Josias de Souza

15/10/2019 04h02

Em resposta à decisão do Supremo de iniciar na quinta-feira o julgamento das ações sobre a regra da prisão em segunda instância, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ) marcou para a tarde desta terça-feira uma sessão extraordinária. Nela, será retomada a discussão sobre uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que assegura a prisão de condenados em dois graus de jurisdição.

Há muita teatralidade na iniciativa dos deputados. Lideranças dos principais partidos com representação na Câmara avaliam que não há na Casa os 308 votos necessários para aprovar a PEC da prisão no plenário, em dois turnos de votação.

A aferição dos líderes esvazia o palavreado do presidente da CCJ, deputado Felipe Francischini. "O que nós queremos é passar um claro recado à população brasileira: que não desacreditem da operação Lava Jato, não desacreditem do combate ao crime, pois aqui na Câmara há deputados que não deixarão isso acontecer", disse Francischini.

Em verdade, quem faz e acontece na Câmara é o bloco pluripartidário que reúne culpados e cúmplices. A PEC da prisão foi apresentada em março de 2018 pelo deputado Alex Manente (Cidadania-SP). A votação na CCJ, primeiro estágio da tramitação legislativa, vem sendo protelada há um ano e meio.

A proposta sugere uma alteração simples. O artigo da Constituição que anota que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória" será reescrito para estabelecer que "ninguém será considerado culpado até a confirmação de sentença penal condenatória em grau de recurso".

A PEC ainda está na fase chamada tecnicamente de "admissibilidade". Não cabe à CCJ debater sobre o mérito da proposição. Os deputados precisam verificar apenas se o texto do autor viola algum preceito legal ou constitucional. Relatora da proposta, a deputada Caroline de Toni (PSL-SC) tem posição favorável à PEC. Assim, não havendo violações redacionais, o normal é que os membros da CCJ aprovem a tramitação da proposta.

Na sequência, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, terá de instalar uma comissão especial para o debate de mérito. Abre-se, então, a temporada de audiências públicas e de apresentação de emendas ao texto. Se sobreviver a esse estágio, a proposta estará pronta para ser levada ao plenário. Algo que dependerá da concordância dos líderes partidários e da boa vontade do presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

Quer dizer: a menos que ocorra um improvável acordo suprapartidário em favor do combate à corrupção e ao crime organizado, é próxima de zero a chance de a PEC da prisão ser levada a voto ainda no ano de 2019. Um dos objetivos de Francischini e seu grupo na CCJ era o de convencer os ministros do Supremo a não julgar ações sobre um tema que é objeto de deliberação do Legisalativo. Mas as togas que despacham na outra quina da Praça dos Três Poderes já se habituaram com o teatro. E não parecem dispostas a retirar o assunto da pauta de quinta-feira.

O deputado Alex Manente, autor da PEC da prisão em segundo grau, instou os colegas no Twitter a agirem "rápido para que Supremo não acabe com esse avanço no combate à corrupção". Rápido? Só se for na CCJ.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.