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Josias de Souza

Novidade no BNDES: Entrevista sem pergunta!

Josias de Souza

18/10/2019 15h24

De passagem por Washington, o presidente do BNDES, Gustavo Montezano, encontrou-se com investidores estrangeiros. Ao discursar, enalteceu a transparência do banco que dirige. Disse que é preciso tratar a "transparência como cultura, não como obrigação." O BNDES "deve querer ser transparente", ele esclareceu. Em seguida, ao se deparar com os repórteres, Montezano revelou-se um personagem muito criativo. Criou a transparência opaca, isenta de limpidez.

"Eu falo com quem garantir que não vai perguntar", declarou o presidente do BNDES aos repórteres. Ele não queria falar sobre uma demissão ocorrida na véspera. O conselho de administração do BNDES colocou no olho da rua André Laloni, diretor da estratégica área de Mercado de Capitais. Alertado para o fato de que uma das funções do repórter é perguntar, Montezano abespinhou-se. E foi embora. Voltou em seguida. Fez uma declaração. Disse que a demissão é "algo normal", nada que mereça preocupação. E ponto.

Não foi por falta de assunto que Montezano se absteve de falar. Ele assumiu o comando do BNDES depois que Bolsonaro eletrocutou Joaquim Levy, o presidente anterior. Uma de suas prioridades é vender as ações de empresas que estão na carteira do banco. E o diretor que caiu, André Laloni, tinha divergências quanto à melhor forma de passar as ações adiante. Sócios involuntários do BNDES, os brasileiros em dia com o Fisco têm o direito de saber que divergências são essas.

Montezano talvez preferisse que os repórteres fossem mais solidários. Mas a única solidariedade que se deve exigir de um repórter é com o seu público, a quem ele deve a obrigação de informar sobre a estupidez humana. Não fosse pelos repórteres, a falta de transparência não deixaria vestígio.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.