Pena de 2ª instância pode valer para áreas cível, tributária e trabalhista
Concebida inicialmente para restabelecer a regra sobre prisão, derrubada pelo Supremo Tribunal Federal, a proposta de emenda à Constituição que tramita na Câmara pode estender a execução da pena na segunda instância da esfera criminal para outros ramos do Direito: cível, tributário e até trabalhista. Foi o que informou ao blog o deputado Marcelo Ramos (PL-AM), virtual presidente da comissão especial a ser instalada nesta quarta-feira (4) para tratar do tema.
"A impunidade não acontece apenas nos processos criminais, quando um condenado deixa de ser preso", disse Marcelo Ramos. "Quando uma pessoa morre antes de receber um precatório do Estado ou um crédito trabalhista de uma empresa também há impunidade. Um empresário que vai à falência antes de conseguir que a União devolva um imposto cobrado indevidamente também é afetado pela impunidade". Do mesmo modo, a mudança apressaria a cobrança em favor da União de débitos tributários reconhecidos por tribunais de segundo grau.
Marcelo Ramos presidiu a comissão especial sobre a reforma da Previdência. Foi guindado à condição de favorito para comandar a comissão que cuidará da PEC da segunda instância porque partiu dele a ideia de resgatar uma proposta apresentada em 2011 pelo então presidente do Supremo Tribunal Federal Cezar Peluso. O texto de Peluso chegou a tramitar no Senado. Agora, foi encampado pelo deputado Alex Manente (Cidadania-SP).
Ao derrubar a regra que autorizava o encarceramento na segunda instância, o Supremo restabeleceu a prerrogativa dos condenados de recorrer em liberdade aos tribunais superiores de Brasília. O castigo só é executado quando ocorre o chamado trânsito em julgado, com o esgotamento de todas as possibilidades de recorrer. A reviravolta abriu as celas de condenados da Lava Jato, entre eles Lula.
Pela proposta de emenda à Constituição (PEC), a fase do trânsito em julgado se esgota na segunda instância. "Para combater eventuais absurdos, cabe a ação revisional", explicou Marcelo Ramos. "Trata-se de ação autônoma, sem efeito suspensivo. Mas o relator do processo no Supremo Tribunal Federal ou no Superior Tribunal de Justiça, ao receber a ação revisional, pode deferir uma cautelar suspendendo a execução quando detectar absurdos".
Ecoando o que dizia Cezar Peluso, Marcelo Ramos sustenta que a PEC combate dois flagelos do Judiciário: a morosidade e a impunidade. "Devolve o Supremo para a sua função de tribunal constitucional. Também devolve o STJ para a função de unificador de jurisprudência federal. Esse projeto é um freio de arrumação no nosso sistema judicial."
Marcelo Ramos reconheceu que a proposta enfrenta resistências na Câmara: "Quem tem problemas resiste. Gato escaldado tem medo de água fria". Avalia, porém, que a ampliação do alcance do projeto pode levar à obtenção dos 308 votos necessários à aprovação de uma emenda constitucional na Câmara.
"É possível construir um texto partindo dessa premissa de que vamos mudar o momento do trânsito em julgado não apenas para os casos de prisão, mas para todo tipo de ação", disse o deputado. "Partindo daí, dá para construir um acordo. Já conversei com alguns ministros do Supremo. Eles concordam. Isso vai reduzir drasticamente o número de processos nos tribunais superiores. Apenas no STJ, há hoje 300 mil processos. Isso é absurdo".
Marcelo Ramos acredita, de resto, que o aproveitamento da fórmula concebida por Peluso retira do debate o caráter casuístico. "O texto do Peluso é de 2011. Isso tem um peso simbólico, porque não havia nessa época mensalão, petrolão, Lava Jato, Lula preso… Não tinha nada disso. Portanto, ninguém pode dizer que é uma proposta oportunista. É uma tentativa de evitar a impunidade que resulta da morosidade do Judiciário."
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