Livre de Negromonte, Dilma procura o substituto
Josias de Souza
31/01/2012 04h54
Prestes a transformar Mário Negromonte no nono ex-ministro do seu governo, Dilma Rousseff enfrenta um drama inusitado. Decidiu manter a pasta das Cidades sob os domínios do PP. O partido reivindica a nomeação de um deputado. E a presidente se pergunta: quem?
Afora Negromonte, momentaneamente licenciado da Câmara, o PP dispõe de uma bancada de 37 deputados federais. Dilma olha para o quadro e não enxerga um mísero nome que seja do seu gosto. Convive com o receio de trocar seis por meia dúzia.
Se dependesse da presidente, o substituto de Negromonte seria o pepê Márcio Fortes. Atual presidente da APO, a Autoridade Pública Olímpica, Fortes comandou as Cidades sob Lula. Teria sido reconduzido por Dilma. Mas a bancada do PP sonegou-lhe apoio.
Ex-líder do partido na Câmara, Negromonte também perdeu o chão que a bancada lhe fornecera em janeiro de 2011, quando de sua nomeação. Os deputados insinuaram uma preferência por Márcio Reinaldo (MG), versado nas manhas do Orçamento. Dilma refugou.
Nesta segunda (30), o candidato a ministro Aguinaldo acompanhava as notícias sobre a queda iminente de Negromonte às voltas com os problemas ocasionados por outro tombo. A mãe do deputado caiu em João Pessoa. E ele decidiu buscar Socorro médico em São Paulo.
Simultaneamente, Negromonte aproximava-se do chão na Bahia. Submetido a constrangimentos numa solenidade em Camaçari, o quase-ex-auxiliar de Dilma colocou o cargo à disposição numa conversa com a future-ex-chefe.
Na véspera, Negromonte, que já não dispunha do apoio partidário, perdeu o último liame que o ligava à Esplanada. O governador petê Jaques Wagner retirou-lhe o suporte. Abandonado por gregos e baianos, Negromonte viu-se compelido a entregar os pontos.
Em entrevista recente, concedida ao repórter Gerson Camarotti, Negromonte saíra-se com uma metáfora demasiado sólida. Declarara-se "mais firme do que as pirâmides do Egito". Cuidara, porém, de abrir uma fenda na tumba: "Se estou numa festa, e está todo mundo de cara feia pra mim, vou embora."
Mal comparando, Negromonte virou uma espécie de Hitchcock de Lifeboat. Alfred Hitchcock, como se sabe, tinha a mania de aparecer nos seus filmes. Nessa fita, que se passa toda dentro de um bote salva-vidas, o diretor aparece de modo inusual.
Surge nas páginas de um jornal lido por um dos sobreviventes. O rosto de Hithcock é o "antes" e o "depois" de um anúncio de regime de emagrecimento. Personagem de um noticiário que fugiu ao seu controle, um Negromonte lipoaspirado pelos fatos virou o "depois" de um anúncio planejado à sua revelia.
Negromonte demorou a se dar por achado. Afora as caretas, Dilma teve de providenciar dois empurrões. Na semana passada, foi ao olho da rua o chefe de gabinete da "pirâmide", Cássio Peixoto. Nesta segunda, o Planalto mandou ao meio-fio João Ubaldo Coelho Dantas, o 'egípcio' que chefiava a assessoria parlamentar do pseudofaraó.
Iniciada na noite passada, a viagem de Dilma a Cuba e ao Haiti encerra-se na quarta-feira (1o). Espera-se que anuncie o nome do novo ministro antes do final de semana. Resta saber se encontrará em quatro dias o que não foi capaz de encontrar em um ano.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
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