Após insuflar CPI, Lula pede ‘equilíbrio’ a aliados
Josias de Souza
19/04/2012 03h32
Em encontro com dirigentes do PMDB, Lula trocou ideias sobre a CPI do Cachoeira, cuja criação será formalizada nesta quinta (19), em sessão plenária do Congresso Nacional. Como que preocupado com a atmosfera envenenada que ronda a investigação parlamentar, Lula pediu "equilíbrio" aos aliados.
Ouviram-no o vice-presidente Michel Temer; o ministro Garibaldi Alves (Previdência); o senador Valdir Raupp (RO), presidente interino do PMDB; e o deputado Henrique Eduardo Alves (RN), líder da legenda na Câmara. O encontro ocorreu no hospital Sírio-Libanês, onde Lula se submete a sessões de fonoterapia.
Na semana passada, Lula insuflou o seu PT a aderir ao pedido de CPI, viabilizando sua instalação. Enxergava na iniciativa uma oportunidade de revidar os ataques que recebera do PSDB e do DEM na época em que ocupou a Presidência, sobretudo na fase do mensalão, escândalo que tisnou seu primeiro mandato.
Nos últimos dias, avolumaram-se no noticiário as evidências de que a CPI não vai trazer problemas apenas para oposicionistas como o governador tucano Marconi Perillo (Goiás) e o 'ex-demo' Demóstenes Torres, ex-algozes que Lula deseja ver de joelhos. Foi às manchetes o governador petista Agnelo Queiroz (DF).
Pior: a Delta Construções, principal empreiteira do PAC, tornou-se o epicentro das investigações. Ficou demonstrado que a oposição vai dispor de matéria prima para arrastar incomodar o governo Dilma Rousseff. O Lula desta quarta (18) soou à caciquia do PMDB bem mais moderado que o Lula que empurrou o PT.
Não abandonou suas obsessões. Mas agora tempera a raiva com a preocupação. A certa altura, injetou Marconi Perillo na conversa. Traz o desafeto atravessado na traquéia desde 2005, quando o governador tucano trombeteou a notícia de que o alertara sobre a existência do mensalão.
Agora entendo porque o Marconi tinha tanto dinheiro na campanha, disse Lula, como que insinuando que o adversário teve as arcas eleitorais de 2010 umedecidas com recursos do esquema de Carlinhos Cachoeira. No pedaço em que revelou-se preocupado, Lula quis saber de Sérgio Cabral, o amigo do PMDB que governa o Rio.
Cabral mantém relações pessoais com Fernando Cavendish, o presidente da Delta. Fisgada nas investigações da PF, a construtora amealhou contratos milionários no governo fluminense. Os dirigentes do PMDB informaram a Lula que, aparentemente, Cabral está tranquilo. Não dirigira à legenda nenhum pedido especial. E divulgara a notícia de que encomendara uma auditoria nos contratos da Delta.
Valendo-se de um linguajar menos carregado do que o utilizado nos encontros com a tribo do PT, Lula defendeu na conversa com o PMDB que o Congresso faça uma investigação sóbria, atendo-se aos fatos e evitando o clima de guerra. Bem ao seu estilo, Michel Temer concordou com a necessidade de moderação. Repisou a velha tecla de que CPI ninguém sabe onde vai dar.
Lula não fez menções específicas à composição da CPI. Um dos presentes sugeriu que ele cuidasse para que o PT escolha um bom relator. Mencionou-se o nome de Cândido Vaccarezza (PT-SP). Ex-líder do governo, o deputado mantém bom trânsito com os partidos governistas e também com as legendas da oposição.
Lula não pareceu animado a intervir. Respondeu que deixará que seu partido defina o nome do relator da CPI. Os dirigentes do PMDB estiveram também com José Sarney, internado no mesmo hospital. Perguntaram se teria alta logo. O presidente do Senado respondeu que permanecerá no leito hospitalar até sábado ou domingo.
Depois, por recomendação médica, ficará mais uma semana em São Paulo. Sarney mostrou-se favorável à leitura do requerimento da CPI em plenário antes do seu retorno. Algo que a deputada Rose de Freitas (PMDB-ES), vice-presidente da Câmara e do Congresso já havia decidido fazer. Antes mesmo do diálogo hospitalar, Rose convocara a sessão para as 10h30 desta quinta (19).
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
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