‘Demóstenes se julgava o papa, vai pedir perdão para quem?’, indaga Eunício, presidente da CCJ
Josias de Souza
27/06/2012 05h44
"Precisamos resolver logo isso", disse Eunício (PMDB-CE) em conversa com o blog. Foi dele a sugestão do calendário que prevê para o dia 11 de julho a votação do pedido de cassação de Demóstenes pelos 80 senadores que terão de julgá-lo. Acha que "o caso é tão escancarado que já ficou chato."
"Adiar esse assunto só submeteria o Senado a mais desgaste", diz Eunício. "Vão dizer que estamos botando sujeira pra baixo do tapete. Meu voto já foi dado. Quem quiser salvar, que salve. Quem quiser cassar, casse. O que não dá é pra deixar de decidir."
Eunício repetiu ao repórter, em timbre jocoso, uma avaliação que diz ter feito ao colega Pedro Taques (PDT-MT), a quem convidou nesta terça (26) para ser o relator do processo na CCJ.
"Gente como o Demóstenes tem que ter cuidado. Eu sou pecador. Mas tenho o padre para pedir perdão. Depois, tenho o bispo, o arcebispo, o cardeal. No limite, posso pedir perdão ao papa. O Demóstenes se julgava o próprio papa. Vai pedir perdão pra quem?"
O senador diz ter formado um juízo sobre o relacionamento de Demóstenes com Carlinhos Cachoeira no dia em que o amigo do contraventor prestou esclarecimentos ao Conselho de Ética. "O Demóstenes foi brilhante na defesa jurídica, mas foi um desastre na defesa política."
Eunício comparou: "Tenho quatro filhas. Minha mulher brinca que só tenho uma, que mora em São Paulo. Mesmo assim, não ligo todos os dias para minha filha. O Demóstenes falava muito mais com o contraventor."
Acrescentou: "O Demóstenes vivia, aqui, de dedo em riste no rosto de todo mundo. É duro, é desagradável esse papel de cassar colegas. Quem já disputou voto sabe o quanto é difícil. Mas o caso dele ficou muito escancarado. Precisamos resolver logo essa questão."
A despeito de suas convicções, Eunício decidiu seguir com rigor o que prevê o regimento. Não quer repetir "o erro" cometido no Conselho de Ética, que encurtou um dos prazos regimentais da defesa e teve de restituir três dias a Demóstenes por ordem do STF. "A CCJ é guardiã do regimento e da Constituição. Não vamos correr riscos."
Antonio Carlos de Almeida 'Kakai' Castro, o advogado de Demóstenes, já havia redigido um mandado de segurança contra a CCJ. Receava que a comissão fosse deliberar sobre o processo já na sessão desta quarta (27), pulando o prazo regimental de cinco sessões. "Fico feliz ao perceber que está sendo cumprido o rito", disse Kakay.
O parecer do relator Pedro Taques será lido e votado na CCJ na próxima quarta-feira (4). Não tratará do mérito das acusações. Dirá apenas se foram respeitados o regimento, as leis e a Constituição.
Eunício informa que, embora não esteja previsto no regimento, dará a palavra ao advogado de Demóstenes se ele quiser falar. Kakay declarou ao repórter que tem questões técnicas a levantar na comissão. Mas ainda não decidiu com seu cliente sobre a conveniência de fazê-lo.
Kakay afirmou, de resto, que não estava sendo meramente retórico quando disse no Conselho de Ética que Demóstenes "quer ser levado ao plenário." Repisou: "Achamos que, cumpridos os ritos, é natural que haja uma decisão."
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
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