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Servidores em greve marcham sobre Esplanada

Josias de Souza

18/07/2012 04h48

Nesta quarta-feira, o enredo da greve que se espraia pelo setor público e já afastou do batente algo como 135 mil servidores ganhará um capítulo coreográfico. Os grevistas marcharão sobre a Esplanada. Um cartaz difundido pela CUT antecipou, em versão impressa, o slogan da corneta: 'Chega de embromação! Negocia, Dilma!'.

Com as orelhas em chamas, Dilma Rousseff esforça-se para manter o sangue frio. Tomada pelo que diz em privado, a presidente guia-se por outro lema: a demagogia é o caminho mais longo entre o Orçamento e sua execução. Aprovada pelo Congresso nesta terça (17), a Lei de Diretrizes Orçamentárias não prevê a concessão de reajustes salariais no ano de 2013.

Há duas semanas, o governo fez chegar às manchetes o tamanho da conta. Estimou-se que o atendimento de todas as reivindicações salariais que estarão representadas no ato de Brasília empurraria para dentro das arcas do Tesouro um espeto anual de R$ 92 bilhões. A soma inclui ministérios, estatais e autarquias.

Num instante em que serve ao setor privado isenções tributárias que roerão parte de sua arrecadação, o governo alega que, curvando-se aos servidores, cometeria uma espécie de suicídio fiscal. E Dilma já declarou em discurso que, em tempos de crise, não é recomendável "brincar à beira do abismo."

Na semana passada, a presidente autorizou os ministros Aloizio Mercadante (Educação) e Miriam Belchior (Planejamento) a abrir uma fenda no dique fiscal. Inaugurou-se uma tardia negociação com os professores de universidades e institutos tecnológicos federais. Além de refugar a proposta, a corporação tachou-a de "farsa".

Em privado, Dilma queixou-se do linguajar do sindicalismo universitário. Autorizados por ela, os ministros levaram à mesa reajustes que, escalonados em três anos, resultarão numa despesa adicional de R$ 3,9 bilhões. Para a presidente, a cifra não merece o desdém com que foi recebida.

O governo estava otimista. Dos 135 mil grevistas, pouco mais de 100 mil são professores. Dilma e seus ministros imaginaram que, devolvendo-os às salas de aula, calariam o alarido das greves. Deu-se o oposto. Os docentes plantaram barracas num acampamento na Esplanada e adensarão a marcha desta quarta.

Visto sob uma ótica estritamente política, o embate opõe o PT a si mesmo. Dilma, Mercadante, Miriam e o gestor do cofre Guido Mantega são todos petistas. E o grosso dos sindicatos que operam as greves do setor público é vinculado à CUT, braço sindical do petismo.

Nesta terça (17), o petista Vagner Freitas, recém-eleito presidente da CUT, foi ao gabinete da ministra Ideli Salvatti, a petista que exerce a coordenação política da Presidência. Rogou que o governo ao menos "destrave" as negociações, para desanuviar a atmosfera.

"A negociação está travada e o governo precisa fazer propostas", disse o mandachuva da CUT em declaração reproduzida no portal da central sindical. "Se os trabalhadores vão aceitar ou não, a categoria resolverá em assembleias, como é o caso dos professores que vão decidir se aceitam ou não o índice de reajuste proposto pelo governo."

Considerando-se as primerias reações dos professores, o comentário do companheiro Vargas soou desconexo. No único caso em que autorizou seus auxiliares a "fazer propostas", Dilma obteve como respostas trovões e raios que os partam. Dona de temperamento mercurial, a presidente parece decidida a trovejar de volta.

Também nesta terça, o ministro Mercadante recebeu em seu gabinete no MEC um grupo de quatro dezenas de reitores de universidades federais. Insinuaram que, se o governo encurtasse o calendário dos reajustes, a proposta poderia ser mais bem recebida. De resto, pediram que fosse feito algum aceno salarial aos servidores técnicos das universidades, que também se encontram em greve.

Conforme relato feito por um dos reitores ao blog, Mercadante fincou o pé. Disse que, divididos em três anos, o tônico salarial oferecido aos professores –entre 27% e 45% dependendo da titulação dos beneficiários— já vai impor enorme sacrifício ao erário. Desse ponto, disse Mercadante aos reitores, o governo não vai passar.

Quanto aos técnicos, o ministro não foi refratário às reivindicações. Mas deixou antever que o governo não cogita negociar com eles antes de resolver a encrenca dos docentes. Ficou entendido que nenhuma palha será movida até que os professores descruzem os braços.

Nesta quinta (18), nas pegadas da marcha 'Negocia, Dilma!', o presidente da CUT levará o discurso pró-destravamento à sala do ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência). É outro petista de quatro costados, ex-chefe de gabinete de Lula, de quem é íntimo amigo.

Gilbertinho, como Dilma o chama, tem entre suas atribuições a de manter desobstruídos os canais de comunicação do governo com movimentos sociais e sindicatos. Na querela em questão, sobram-lhe disposição e saliva. Só lhe faltam as verbas que permitiram dizer ao companheiro Vagner Freitas o que ele quer ouvir.

No seu périplo brasiliense, o presidente da CUT deseja avistar-se também com Miriam Belchior. Por ora, a ministra do Planejamento não se dispôs a marcar a audiência. No seu caso, faltam as verbas e a disposição para o desperdício de saliva. Vagner Freitas pedirá a Gilbertinho que interceda em seu favor.

Acossada por uma crise internacional que desafia sua fama nacional de boa gerente, Dilma faz cara feia para um funcionalismo que, sob Lula, foi tratado a pão-de-ló. Na sucessão de 2010, a CUT foi porta-bandeira do bloco sindical que pegou em lanças para apoiar Dilma e espetar o antagonista tucano José Serra. Agora, apresentada à fatura, a presidente manda dizer: campanha, campanha, orçamento à parte.

Resta agora saber de que lado vai romper a corda. O governo informa que, no final do mês, os grevistas terão a oportunidade de conferir o tipo de matéria prima de que Dilma é feita. A disposição da presidente poderá ser medida nos contracheques, que trarão os primeiros cortes no ponto dos servidores que aderiram às paralisações. A conferir.

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.


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