Voto de Barbosa expõe a incoerência de Serra
Josias de Souza
19/09/2012 16h48
No dia 4 de junho, ainda na fase de montagem das coligações que disputam a preferência do eleitor em São Paulo, Serra recepcionou em sua caravana o PR. Negociado com Valdemar, o acerto rendeu ao candidato do PSDB à prefeitura paulistana uma vantagem e um incômodo.
Um minuto e trinta segundos de tempo de tevê, eis a vantagem. A companhia de um aliado radioativo, eis o incômodo. Instado a comentar o paradoxo no dia da formalização da parceria, Serra alegara que faz alianças "com partidos, não com pessoas." Dissera que os aliados ajustam-se ao seu "estilo de governar."
Perguntara-se a Serra se não receava a proximidade com um réu da ação penal do mensalão. E ele, dando de ombros: "Se for proibido para partidos que têm pessoas que estão no processo, o PT não poderia nem disputar eleição, porque foi ele que coordenou e que comandou a organização desse chamado mensalão."
Agora, em dificuldade nas pesquisas, Serra faz dos ataques ao mensalão um hábito. Na propaganda eletrônica, sua equipe de marketing associa o rival Fernando Haddad aos réus petistas José Dirceu e Delúbio Soares. Insinua que a eleição de um significará o retorno dos outros.
Levando-se o raciocínio a sério, o triunfo de Serra submeteria o eleitor paulistano ao risco de empurrar Valdemar para dentro de uma eventual administração tucana na prefeitura. O mesmo Valdemar que, segundo acaba de atestar o relator Barbosa, recebeu valerianas de R$ 10,8 milhões.
Valdemar recebia o dinheiro sujo do mensalão por meio de um preposto de nome sintomático: Jacinto Lamas. Então tesoureiro do PL (antigo nome do PR), Lamas recolhia o dinheiro vivo numa agência brasiliense do Banco Rural e em quartos de hotel. Os maços de cédulas chegavam-lhe em "envelopes, pacotes e sacolas de lona", relatou Joaquim Barbosa.
Lamas entregava o dinheiro a domicílio, na casa de Valdemar. Numa oportunidade, um envelope de dinheiro foi entregue num flat indicado por Valdemar, em São Paulo. Outra parte foi repassada ao deputado por meio de uma corretora chamada Guaranhus.
Em troca, disse Barbosa, o agora aliado de Serra provia votos e apoio ao governo Lula na Câmara. Além do crime de corrupção, o ministro imputou a Valdemar os delitos de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Não são negligenciáveis as chances de que os demais ministros do STF acompanhem o relator no seu voto.
Ao vincular-se a uma condenação esperando para acontecer, Serra expôs a ilógica que guia as composições políticas no Brasil. Esse tipo de acerto tem cara de lógica, penas de lógica, rabo de lógica, trinado de lógica, mas é oportunismo.
Agora mais do que antes, sempre que Serra esfregar o mensalão na cara de Fernando Haddad, arrisca-se a ouvir uma indagação: E o Valdemar? Ficou entendido o seguinte: se a honestidade é um petista que ainda não descobrira os encantos de um Maluf, a coerência é um tucano que ainda não se dera conta do valor de Valdemar.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.