Em novo jantar no Alvorada, Dilma afaga o PP
Josias de Souza
14/11/2012 03h58
Pragmática, Dilma ajusta o cardápio ao paladar dos comensais. Na véspera, acenara a Gilberto Kassab com a perspectiva de entrada do seu PSD na Esplanada dos Ministérios. Ao PP, sinalizou a permanência do deputado Aguinaldo Ribeiro na pasta das Cidades. Presente ao repasto, o ministro ouviu elogios da chefe.
Num instante em que o noticiário está apinhado de referências sobre os ajustes que Dilma fará em sua equipe, as referências à capacidade técnica de Aguinaldo foram saboreadas como uma espécie de certificado de permanência.
No pedaço do jantar dedicado às urnas de 2012, realçaram-se o desempenho do PP e as parceiras do partido com o PT, especialmente em São Paulo. Ali, em acordo ornado pela foto de Paulo Maluf com Lula e Fernando Haddad, o PP associou-se à vitória do PT sobre José Serra, o rival do PSDB.
Dilma absteve-se de convidar Maluf. Como que vacinada, evitou a associação tóxica que rendeu ao padrinho Lula muitos metros de manchetes molestas. Pelo PP, foram à mesa, além de Aguinaldo, o senador Francisco Dornelles (RJ), presidente da legenda; e o deputado Arthur Lira (AL), líder na Câmara.
Dilma providenciou duas testemunhas do PT: os ministros Aloizio Mercadante (Educação) e Ideli Salvatti (Coordenação Política). Também esteve no Alvorada o chefe de gabinete da anfitriã, Giles Azevedo.
Tomada pelo novo estilo, afável a mais não poder, Dilma parece ter descoberto que a política é a arte da conversa. Percebeu que a costura da aliança de 2014 requer saliva e um certo desperdício de tempo. Algo que, nos primeiros dois anos de mandato, não se dispôs a fazer.
Antes do PP e do PSD, a presidente jantara com o presidente do PSB, Eduardo Campos, e com almoçara com os irmãos Cid e Ciro Gomes, adversários do projeto presidencial do governador de Pernambuco. Dilma também pusera a mesa para as cúpulas do PMDB e do PT.
Passada a temporada de repastos, a moradora do Alvorada talvez tenha de fazer uma dieta. Mas, com seu apetite, emagrece as articulações do neopresidenciável Eduardo Campos e do tucano Aécio Neves, provável candidato do PSDB. Ambos trabalham com a hipótese de atrair para suas caravanas legendas que hoje gravitam na órbita governista.
Kassab tem uma dívida de gratidão com Eduardo, que o ajudou a pôr em pé o seu novo partido. Cooptando-o, Dilma evita, desde logo, que o tempo de tevê do PSD sirva de estímulo para que o mandachuva do PSB atravesse o seu Rubicão. Dornelles é primo de Aécio. Adulando-o, a presidente atenua os riscos de que o parentesco evolua para um enlace político.
Considerando-se o conhecido estilo de Dilma, duro e seco, pode-se depreender que o estreitamento das relações políticas não a deixam exatamente feliz. Porém, ela se vê agora compelida a preparar a própria reeleição. Discípula aplicada de Lula, Dilma cuida de alimentar as víboras que seus aliados carregam na alma.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.