Collor e UNE tentam pegar carona em protestos
Josias de Souza
19/06/2013 05h28
Quem viveu viu. Antagonistas em 1992, Fernando Collor e a União Nacional dos Estudantes estão do mesmo lado em 2013. O presidente do impeachment e a entidade que foi às ruas para exigir sua deposição tentam agora pegar carona nos protestos que mobilizam dezenas de milhares de pessoas.
Em textos e vídeo veiculados no seu site, a UNE faz pose de protagonista de um movimento cuja principal característica é a ausência de comando. Numa "notícia" exposta na página que mantém na internet, Collor desceu ao asfalto, por assim dizer, na mesma faixa.
"É preciso entender que o protesto é legítimo, sobretudo quando se observa que a grande maioria se revolta contra a majoração da passagem de um transporte de péssima qualidade", diz Collor. "Só sairemos da rua quando baixar o preço da passagem e o governo [tucano de São Paulo] garantir mais democracia", ecoa Vic Barros, recém-eleita presidente da UNE.
Nessa parceria involuntária, o veterano Collor e a jovem Vic alvejam o mesmo PSDB. Collor questiona Teotônio Vilela Filho, governador tucano de Alagoas, sua província. "O que ele propõe em relação ao sistema de transporte de massa, inclusive intermunicipal?" E quanto à desoneração do setor, "o que está fazendo" o governador?
Vic critica o tucano que administra São Paulo. "Em um Estado Democrático de Direito não vamos aceitar que o governador Geraldo Alckmin use mais uma vez a força e truculência de sua PM para evitar protestos legítimos", declara.
Para Collor e os ex-caras-pintadas o tempo já não existe. Só existe o passar do tempo. Que fez a o relógio com eles? Aproximou-os. Primeiro, juntaram-se na oceânica base de apoio a Lula. Collor na pele de um festejado senador do governista PTB. A UNE na condição de parceira de movimento $ocial. No momento, a entidade estudantil exibe no seu site a logomarca da Caixa Econômica Federal.
Collor não perde oportunidade de realçar seu reposicionamento no palco. Na sua "notícia", cuidou de elogiar Dilma por ter considerado "legítimo o movimento" que contesta os governantes de modo difuso e generalizado. O senador mimetizou a presidente nas ressalvas e nos elogios.
"Excetuando alguns radicais, a imensa maioria da juventude que está ocupando as ruas possui uma motivação justa, que precisa ser observada pela classe política brasileira e pelos gestores públicos", afirmou o ex-inimigo dos estudantes.
A companhia virtual de Collor não chega a dignificar a UNE. Mas é preciso enquadrar a parceria metafórica numa perspectiva histórica. Com o passar do tempo, até a Paola Oliveira um dia será um fóssil.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.