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Após protestos, PT cancela seminários festivos e marca 'último' ato com Lula e Dilma, na Bahia

Josias de Souza

19/07/2013 19h48

Os protestos de rua atropelaram a programação festiva que o PT idealizara para o ano pré-eleitoral de 2013. No ano em que completou 33 anos de fundação, o partido programara 13 seminários para celebrar os seus 10 anos no poder federal. Realizou apenas cinco. Marcou para quarta-feira (24) da semana que vem, em Salvador, o "ato que encerrará o ciclo de comemorações". Sem maiores explicações, a legenda cancelou sete seminários.

Lula e Dilma Rousseff confirmaram presença no evento de Salvador. Será a primeira aparição pública dos dois desde o início das manifestações. Deveriam ter estrelado um seminário em Goiânia, no dia 20 de junho. Porém, a capital de Goiás foi sacudida por um protesto de rua nesse dia. E o PT prefefiu "adiar" o ato, agora definitivamente cancelado.

O primeiro dos 13 seminários programados inicialmente ocorreu em São Paulo, em 20 de fevereiro. Serviu para que Lula lançasse a recandidatura de Dilma. Secretário nacional de Organização do PT, Paulo Frateschi explicou na época: "Nós estamos programando uma série de seminários, e vamos tentar correr todas as regiões do Brasil, pra que a gente possa começar a construir a nossa narrativa sobre o governo democrático e popular que nós lideramos durante esses dez anos."

Frateschi dizia que o partido colecionara "uma quantidade de dados enorme". Dados que, segundo ele, atestavam o êxito dos governos Lula e Dilma. De repente, a insatisfação foi às ruas. Dilma despencou nas pesquisas. Lula arrpendeu-se de ter precipitado a campanha. O PT tornou-se uma legenda sem roteiro. A falência do discurso baseado na teoria do "sucesso inquestionável" ficou evidenciada no seminário de Curitiba, ocorrido em 13 de junho.

Nesse dia, o asfalto fervia em São Paulo. E Lula, discursando na capital paranaense ao lado de Dilma, divertia a plateia falando sobre a popularidade de sua sucessora: "Se não tomar cuidado, a baixinha vai passar dos 100%. E não pode, só pode até 100". Decorridos 15 dias, o Datafolha informaria que a taxa de aprovação de Dilma despencara 27 pontos –de 57% para 30%. A taxa de intenções de votos da "baixinha" ruiu de 51% para 30%.

No mesmo discurso paranaense, Lula soara premonitório. Criticara a mídia, "a verdadeira oposição nesse país." E ironizara: "Parem de contar mentira, porque esse povo já aprendeu a pensar com a sua própria cabeça, de forma independente. Esse povo não se deixa mais enganar como antigamente… Esse povo tem outros instrumentos de comunicação para ter acesso à informação."

Suprema ironia: pelo Facebook, seu "instrumento de comunicação" predileto, o pedaço mais jovem "desse povo" programava manifestações que levariam mais de 1 milhão de brasileiros ao asfalto, num movimento que roeu as certezas e engolfou as autoridades constituídas, entre elas a "baixinha", cuja estatura foi reajustada.

Nos cinco dos 13 seminários que conseguiu realizar, o PT seguiu um roteiro invariável. Escolhia a área do governo cujos feitos pretendia exaltar e escalava o ministro responsável pelo setor para abrir o falatório. Para o evento de Salvador, providenciou-se um ajuste. Em vez de tratar de programas oficiais, o PT falará de "participação popular e movimentos sociais". No dizer de Jonas Paulo, presidente do PT na Bahia, o tema escolhido "reforça a preocupação do nosso partido com o atual cenário político vivido pelo país."

Escalou-se para inaugurar o trololó o ministro Gilberto Carvalho (Secretário-Geral da Presidência). É ele o responsável no governo pelos contatos com centrais sindicais e ONGs. Para simbolizar a conexão do partido com a sociedade, convidaram-se representantes de entidades que, nos últimos dez anos, vincularam-se monetariamente aos governos petistas: "movimentos sociais, centrais sindicais, movimentos pela terra e movimentos estudantis".

Neste sábado (20), a cinco dias do derradeiro seminário, o PT reúne em Brasília o seu diretório nacional. Convidada, Dilma é aguardada. Mas não havia confirmado sua presença até o início da noite desta sexta (19). A crise de identidade do partido estará no centro da agenda. Prepara-se uma resolução a ser votada pelo diretório. No texto, o PT deve fazer uma leitura dos protestos de rua.

O partido ecoará a versão edulcorada que Lula e Dilma construíram junto com o marqueteiro João Sanatana no alvorecer das manifestações. Nessa versão, o "sucesso" dos governos do PT teria levado a juventude às ruas para reinvindicar "mais avanços".

Ou seja: num instante em que o ex-favoritismo de Dilma derrete, o PT se esquiva da autocrítica e tenta se apresentar como parte da solução, não do problema. As pesquisas indicam que, por ora, não colou. Como diria Lula, "esse povo não se deixa mais enganar como antigamente."

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.


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