Traduza-se black bloc para português: bandido
Josias de Souza
27/10/2013 06h10
Em junho, quando as ruas ferveram, eles eram chamados de "minoria de vândalos". Infiltravam-se nos protestos e, do meio para o final, transformavam pacíficas manifestações em surtos de desordem. Eles eram poucos. Mas foram ganhando a adesão de uma legião de desocupados. Gente que enxergou na algazarra uma oportunidade para realizar saques e pequenos furtos.
A violência foi ganhando ares de rotina. Eles investiam contra policiais e jornalistas, incendiavam ônibus, depredavam estações de metrô, atacavam agências bancárias, destruíam caixas eletrônicos, estilhaçavam vitrines de lojas, lançavam coqueteis molotov em prédios públicos… Aos pouquinhos, foram migrando dos rodapés de página para as manchetes.
Com o passar dos dias, verificou-se que eles macaqueavam ativistas europeus e americanos. Imitavam-nos nas vestes, no gestual e nos métodos. Ganharam apelido chique: black blocs. E a destruição passou a ser justificada como "protesto consciente de inspiração anarquista". Supremo paradoxo: disfarçados de inimigos do capitalismo, estudantes bem-nascidos tornaram-se um estorvo para a gente simples das cidades.
Exaltados pela imprensa dita alternativa, do tipo Ninja, eles ganharam a cena. Intimidada, a polícia assistiu, por vezes passivamente, ao recrudescimento da violência. Amedrontada, a rapaziada pacífica voltou para casa. O ronco do asfalto virou lamúria. Numa visita às ruas de São Paulo, os pesquisares do Datafolha acabam de verificar que 95% dos paulistanos não suporta mais a anarquia.
Já passou da hora de definir melhor as coisas. Está nas ruas uma estudantada corpulenta, de cara coberta e violenta. Esse grupelho adquiriu o vício orgânico de tramar contra o sossego alheio. Vândalos? É muito pouco! Black Blocs? O escambau! Traduza-se para o português: bandidos, eis o que são.
Num instante em que a sociedade se escandaliza com os PMs que torturaram e mataram Amarildo numa unidade pseudopacificadora da favela do Rio, convém abrir os olhos para as atrocidades cometidas pela bandidagem que faz Bakunin revirar no túmulo. Repare nas duas cenas que se seguem:
Cena 1: A selvageria
"Pega, peeega, peeeeeega!" Estamos no centro de São Paulo, no meio de mais uma manifestação promovida pelo Movimento Passe Livre, cujo objetivo declarado é o de zerar as tarifas de ônibus, metrô e trem. É sexta-feira (25/10), 20h20.
Selvagens com os rostos cobertos cercam o coronel da Polícia Militar Reynaldo Simões Rossi. Passam a agredi-lo com pauladas e pontapés. Imprensado contra uma pilastra, o soldado cai.
"Eu me recordo que eu fui projetado ao solo a partir de uma pancada na cabeça que eu levei", Reynaldo contaria depois. No solo, ele ainda tenta proteger a cabeça com as mãos. Inútil. Intensificam-se os golpes.
Zonzo, Reynaldo se levanta. É empurrado pelas costas. À sua direita, um dos agressores o atinge com uma chapa metálica bem na cabeça. Ele corre. Os algozes o perseguem. "Na segunda onda de agressões, eu já estava perdendo um pouco a lucidez", diria depois da surra. Foi então que, empunhando o revólver, um soldado metido em roupas civis resgata o coronel Reynaldo, livrando-o dos seus torturadores.
Cena 2: A sensatez
Já sob a proteção de seus soldados, o coronel Reynaldo faz cara de dor. Antes de se enfiar no banco traseiro da viatura policial que o levaria para o hospital, ele pronuncia uma derradeira ordem. Em meio à insensatez, o coronel diz algo sensato: "Não deixa a tropa perder a cabeça!"
Reynaldo passou a noite no hospital. No dia seguinte, com um dos braços na tipóia, ele contabilizou os prejuízos: "Eu tenho os dois omoplatas fraturados: um, integralmente; outro, parcialmente. Tenho lesões na perna, no abdômen, e tenho duas lesões na cabeça."
Tardiamente, as polícias do Rio e de São Paulo começam a lidar com a tribo dos sem-rosto de maneira mais profissionalizada. Para evitar o moto-contínuo das prisões que duram menos de uma noite, reúnem provas que permitirão aos juízes impor aos criminosos penas compatíveis com os seus crimes.
Até Dilma Rousseff já acordou: "Agredir e depredar não fazem parte da liberdade de manifestação. Pelo contrário", ela escreveu no Twitter. "Presto minha solidariedade ao coronel da PM Reynaldo Simões Rossi, agredido covardemente por um grupo de black blocs em SP", acrescentou. Alvíssaras!
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.