Deputado ofende quilombolas, índios, gays e lésbicas: 'Tudo que não presta'
Josias de Souza
12/02/2014 17h46
O vídeo acima foi gravado em 29 de novembro de 2013 na cidade de Vicente Dutra, região norte do Rio Grande do Sul. Exibe cenas de uma audiência pública da Comissão de Agricultura da Câmara. Debatia-se o acirramento dos conflitos que opõem índios e fazendeiros em várias Estados. A pretexto de defender os interesses dos proprietários rurais, dois deputados federais gaúchos ofenderam minorias, incitaram a violência e atacaram o ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência da República).
Presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, o deputado ruralista Luís Carlos Heinze (PP-RS) disse que, quando precisa impulsionar o crescimento econômico, o governo recorre ao agronegócio, estimulando-o com financiamentos. Em seguida, foi ao ataque: "O mesmo governo, seu Gilberto Carvalho também é ministro da presidenta Dilma. É ali que estão aninhados quilombolas, índios, gays, lésbicas, tudo que não presta, ali está aninhado. E eles têm a direção e têm o comando do governo."
Noutro trecho do vídeo, dirigindo-se a produtores rurais gaúchos, Heinze ensinou uma tática empregada para defender suas propriedades de investidas indígenas: "…O que estão fazendo os produtores do Pará? No Pará, eles contrataram segurança privada. Ninguém invade no Pará, porque a brigada militar não lhes dá guarida lá e eles têm de fazer a defesa das suas propriedades. Por isso, pessoal, só tem um jeito: se defendam. Façam a defesa como o Pará está fazendo."
Heinze prosseguiu: "Façam a defesa como o Mato Grosso do Sul está fazendo. Os índios invadiram uma propriedade. Foram corridos da propriedade. Isso foi o que aconteceu aconteceu lá. […] Eles estão se defendendo. Se é isso o que o governo quer, é isso que nós vamos fazer. Resolvemos os sem-terra lá em 2000. E vamos resolver os índios agora, não intressa o tempo que seja."
O vídeo exibe trechos do discurso de outro parlamentar ruralista, o deputado federal Alceu Moreira (PMDB-RS). Ele também investe contra o ministro Gilberto Carvalho, responsável no Planalto pelos contatos com organizações sindicais e movimentos sociais.
"Por que será que, de uma hora pra outra, tem que demarcar terra de índios e quilombolas?", pergunta o deputado. "O chefe dessa vigarice orquestrada está na ante-sala da Presidência da República. E o nome dele é Gilberto Carvalho. É ministro. Ele e seu Paulo Maltus [secretário de Articulação Social]."
Alceu Moreira alvejou também uma entidade ligada à Igreja Católica, o CIMI, Conselho Indigenista Missionário: "Por trás dessa baderna, essa vigarice, está o CIMI, que é uma organização cristã, que de cristã não tem nada. Está a serviço da inteligência norte-americana e europeia, para não permitir a expansão das fronteiras agrícolas do Brasil."
De resto, o deputado peemedebista pronunciou algo muito parecido com uma declaração de guerra: "Nós, os parlamentares, não vamos incitar a guerra. Mas lhes digo: se fartem de guerreiros e não deixem um vigarista desses dar um passo na sua propriedade. Nenhum! Nenhum! Usem todo o tipo de rede. Todo mundo tem telefone. Liguem um para o outro imediatamente. Reúnam verdadeiras multidões e expulsem do jeito que for necessário."
Levado à internet nesta quarta-feira (12) por um movimento chamado 'Mobilização Nacional Indígena', o vídeo foi reproduzido no site do 'Greenpeace Brasil'. Para a entidade, os deputados "não só incitam a violência contra lideranças indígenas que tentam retomar suas terras invadidas por fazendeiros, grileiros e madeireiros, como também insultam gays e lésbicas, e reforçam o discurso inverossímil acerca da demarcação de terras indígenas para o público de produtores rurais".
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
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