Governo teme reação de diretor demitido da BR
Josias de Souza
24/03/2014 06h09
Mobilizados pelo Planalto para barrar a CPI da Petrobras, líderes do pedaço do pelotão governista leal a Dilma Rousseff estão otimistas quanto às chances de sucesso da articulação. Receiam, porém, que uma eventual reação incendiária do demitido Nestor Cerveró complique a operação.
Cerveró é o autor daquele documento que Dilma Rousseff diz tê-la induzido a avalizar erroneamente a compra da refinaria americana de Pasadena, em 2006. A presidente empurrou Cerveró para dentro de um microondas ao anotar num texto oficial que o documento dele, recheado com "informações incompletas", era "técnica e juridicamente falho".
Do exterior, onde se encontra em viagem de férias, Cerveró levou a mão ao fósforo. Fez isso ao sinalizar, em diálogos telefônicos com pelo menos dois de seus contatos no mundo da política, que não admitiria ser tratado como executivo relapso ou desonesto. Seu timbre era de ameaça.
Pouco depois, já bem passado, Cerveró foi aconselhado a se demitir. Disse que não sairia. Na sexta-feira (21), ele foi exonerado da diretoria Financeira da BR Distribuidora, o posto para o qual havia sido deslocado após perder, em 2008, a poltrona de diretor Internacional da Petrobras.
Apadrinhado pelo PT e avalizado pelo PMDB —e vice-versa— Cerveró tornou-se um fio desencapado. Em gestões subterrâneas, o petismo tenta convencê-lo a passar fita isolante na língua. Os operadores do 'deixa-disso' afirmam que não há o que possa ser dito contra Dilma.
Nessa versão, o que o governo teme é que, tomado pela irritação, Cerveró forneça faíscas à oposição. Na melhor hipótese, daria discurso para os antagonistas de Dilma Na pior hipótese, acenderia a CPI.
Nesta terça (25), o presidenciável tucano Aécio Neves reúne a oposição para definir a estratégia do bloco pró-CPI. No final de semana, Aécio conversou com o ex-presidente Fernando Henrique Carodso e com o governador Geraldo Alckmin, de São Paulo. Ambos haviam declarado que uma boa investigação do Ministério Público tornaria a CPI desnecessária. Em nome da unidade, foram convencidos a dar meia-volta.
FHC reposicinou-se em cena por meio de uma nota. Escreveu: "Os acontecimentos revelados pela imprensa sobre malfeitos na Petrobras são de tal gravidade que a própria titular da Presidência, arriscando-se a ser tomada como má gestora, preferiu abrir o jogo e reconhecer que foi dado um mau passo no caso da refinaria de Pasadena. Pior e fato único na história da empresa: um poderoso diretor está preso sob suspeição de lavagem de dinheiro."
"Sendo assim", acrescentou FHC, "mais do que nunca se impõe apurar os fatos. Embora, antes desse desdobramento eu tivesse declarado que a apuração poderia ser feita por mecanismos do Estado, creio que é o caso de ampliar a apuração. O presidente do PSDB, senador Aécio Neves, conduzirá o tema, em nome do partido, podendo mesmo requerer, com meu apoio, uma CPMI."
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.