Oposição declara guerra a Renan por CPI mista
Josias de Souza
29/04/2014 19h43
Reunidos no final da tarde desta terça-feira (29), os líderes da oposição na Câmara esboçaram uma declaração de guerra contra Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado e do Congresso. Decidiram dar um prazo de 24 horas para que Renan tome as providências necessárias à instalação de uma CPI mista da Petrobras, com deputados e senadores. Se não foram atendidos, pretendem requerer o impeachment de Renan no Conselho de Ética do Senado e pedir à Procuradoria da República que abra uma ação penal contra ele por descumprir a Constituição.
A encrenca começou a se formar no instante em que os líderes da oposição detectaram a preferência de Renan por uma CPI que reúna apenas os senadores, sem a presença de deputados. Essa predileção foi farejada numa visita dos líderes do PSDB, DEM, PPS, Solidariedade e PSB ao gabinete de Renan. Foram pedir que, como presidente do Congresso, ele priorizasse a CPI mista. Renan alegou que seria necessário aguardar até 20 de maio, quando ocorrerá a próxima reunião do Congresso, em sessão bicameral.
Os líderes desmontaram a esperteza. Recordaram a Renan que a instalação da CPI mista já não depende da sessão do Congresso. O pedido já foi lido em plenário e publicado no Diário do Congresso. Pelo regimento, cabe a Renan requerer aos líderes que indiquem os representantes de cada partido na comissão e marcar a data de instalação.
Renan pediu prazo até as as 18h para dar uma resposta. Do gabinete da presidência do Senado, os oposicionistas foram para a sala da liderança do DEM na Câmara. Concluíram que Renan os embromava. Ao fundo, a TV Senado exibia a chegada de Renan ao plenário. Os deputados ouviram-no dizer que:
1. "Por dever funcional" recorrerá ao plenário do STF contra a decisão da ministra Rosa Weber, que determinou a imediata instalação da CPI exclusiva, para investigar apenas Petrobras.
2. Como o recurso não tem "efeito suspensivo", pediu aos líderes partidários que indiquem "imediatamente" os seus representantes na CPI do Senado. Marcou a instalação para a próxima terça-feira (6).
E quanto à à CPI mista? "A oposição sempre deixou clara sua preferência pela CPI mista, mas sua instalação não poderá acontecer por iniciativa do presidente do Senado", desconversou Renan. "A decisão de uma CPI se sobrepor à outra tem que ser política." E daí? Bem, Renan convocou uma reunião com os líderes para discutir o tema. Quando? Na terça-feira, o mesmo dia que escolheu para instalar a CPI do Senado.
Irritados com o lero-lero de Renan, os deputados que representam as bancadas de oposição na Câmara marcharam da sala da liderança do DEM para o plenário do Senado. Como deputados não têm o direito de falar nas sessões do Senado, fizeram os senadores de porta-vozes. Falando pelas bocas dos senadores Alvaro Dias (PSDB-PR) e José Agripino Maia (DEM-RN), os deputados pediram a Renan que antecipasse a reunião da semana que vem para esta quarta. Renan desconversou.
Pintados para a guerra, os deputados foram ao gabinete do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Pediram que fosse chamado o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ). Informaram a ambos as providências que adotarão contra Renan se ele insistir em excluir os deputados da CPI. Pediram que não confundissem a escalada como uma iniciativa contra o PMDB. O alvo é Renan, não o partido.
De resto, os deputados pediram aos líderes do PSDB e do DEM no Senado, Aloysio Nunes Ferreira e Agripino Maia, que avisassem a Renan sobre a batalha que ele pode inaugurar. Encomendaram às assessorias jurídicas dos partidos a preparação de um pedido de impeachment do presidente do Senado e de uma representação à Procuradoria Geral da República, solicitando a abertura de ação penal por violar a Constituição no trecho que assegura às minorias o direito de requerer a abertura de CPIs.
É absolutamente improvável que o Senado acate um pedido de impeachment Renan. Quanto ao pedido de ação penal, não há a mais remota garantia de que a Procuradoria o acate. Porém, o confronto com os deputados renderá a Renan um inegável prejuízo político. O senador será levado ao noticiário como um "empata CPI".
A tática de Renan é clara como água de bica: tentou embaralhar a investigação misturando a Petrobras com trens e portos. Como o STF não deixou, tenta manter a investigação no cercadinho do Senado, que imagina controlar. Se conseguir, protege seus feudos na Petrobras e e vende proteção ao Planalto. Por mal dos pecados, o movimento dos deputados já não se restringe à oposição. Ganhou a adesão de partidos governistas. Entre eles o PMDB de Renan.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
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