Transposição é símbolo da era da supergerente
Josias de Souza
13/05/2014 19h45
Eleita como supergerente, Dilma Rousseff chega ao fim do mandato com dificuldades para gerenciar o vexame da Transposição do Rio São Francisco. Chefe da Casa Civil de Lula, Dilma coordenava o PAC, que tinha na transposição uma prioridade. Na campanha de 2010, a obra foi à vitrine como grande feito do presidente-operário e da candidata-gestora. Na campanha de 2014, virou um estelionato verbal.
Nos planos originais da ex-gerente, o sertão seria irrigado ainda em 2010. Não deu. Dezessete dias antes de passar a faixa presidencial para Dilma, Lula vaticinou, numa visita sentimental ao canteiro do São Francisco: "Estou percebendo que a obra vai ser inaugurada definitivamente em 2012, a não ser que aconteça um dilúvio…" Era mais conversa mole.
Nesta terça-feira (13), instada a comentar o vexame do dilúvio seco, Dilma como que assumiu sua condição de ex-Dilma: "A gente começou bastante inexperiente, e houve uma subestimação. Em nenhum lugar do mundo em dois anos é feita uma obra dessa dimensão. Ela é bastante sofisticada, leva um tempo de maturação. Houve atraso porque se superestimou a velocidade que ela poderia ter, minimizando a complexidade."
Ministra, Dilma avalizara um orçamento de R$ 4,8 bilhões. Presidente, convive com previsões que jogam o custo da transposição para R$ 8,4 bilhões. Na pele de 'Mãe do PAC', a supergestora autorizara a implantação dos canteiros de obras a partir de "projetos básicos", eufemismo para uma falta de planejamento que agora estoura no colo da ex-bambambã.
No cronograma oficial, a fita da transposição será cortada em 2015, primeiro ano do mandato do próximo presidente. No paralelo, a coisa é empurrada para 2016. O TCU suspeita que, se não melhorar a gestão, o atraso pode ser ainda maior. Mas a recandidata não se dá por achada. Ela agora acena com uma transposição em conta-gotas. E promote as primeiras gotas já para 2014.
"Vamos antecipar a chegada de água às pessoas, não necessariamente com inauguração formal. A obra tem estágios. Vai ficando pronto, e nós vamos deixando para uso da população." Alvíssaras! Os sertanejos já preparam as tinas e os baldes. Os mais ingênuos já coçam o dedo indicador, aquele que pressiona as teclas da urna eletrônica.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.