CPI da Petrobras vai do patético para o cômico
Josias de Souza
22/05/2014 17h25
A CPI instalada no Senado para não investigar a Petrobras reuniu-se de novo nesta quinta-feira. Ouviu, sem muita curiosidade, o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. Com pequenas variações, ele não disse as mesmas coisas que já não havia declarado antes. Mas a sessão trouxe uma grande novidade alvissareira: os governistas da CPI atingiram o nirvana do governismo. Sendo difícil manter a presença de espírito diante de tanta pantomima, os aliados de Dilma Rousseff decidiram exercitar a ausência de corpo.
A CPI tem 13 membros. Contando os suplentes, são 26. Compareceram à sessão em que Cerveró não foi apertado apenas três. Ou 11,5% do total. Tirando o presidente Vital do Rêgo (PMDB-PB) e o relator José Pimentel (PT-CE), só havia em plenário uma senadora: Vanessa Graziottin (PCdoB-AM). Para o custo do teatro, foi um espetáculo pobre, muito pobre, paupérrimo.
A conta ainda não foi feita. Mas você está pagando uma fortuna. O palco, a iluminação, o som, o cafezinho e a TV para transmitir ao vivo. Além de tudo isso, você ainda banca a casa, a comida, o celular, o transporte, os assessores e os salários dos atores. Mas, calma, não tome decisões precipitadas. Antes de se dirigir ao Procon, para pedir o dinheiro de volta, você precisa conhecer alguns detalhes. É injusto dizer que já não se fazem CPIs como antigamente.
Sim, é verdade, as diferenças são notáveis. O relator agora entrega as perguntas com antecedência para o depoente. Por escrito. Mas o que se diz nos bastidores é que a CPI, apesar da ternura, a CPI não deixa de endurecer. Nestor Cerveró teve de sentar numa cadeira mais baixa do que as outras. Não lhe foi dada a oportunidade de lançar aquele seu olhar oblíquo de cima para baixo.
A plateia não reparou. Mas os governistas confidenciam que o garçom tinha ordens para servir café amargo ao autor do parecer "técnica e juridicamente falho" sobre Pasadena. E ninguém pense que Cerveró teve vida fácil longe das câmeras. O Senado pagou o bilhete para que ele se deslocasse do Rio até Brasília. Mas os aliados de Dilma relatam que a assessoria reservou para ele uma poltrona na última fileira do avião. Que não reclina.
Um senador do bloco governista jura ter testemunhado, à distância, a chegada do depoente ao prédio do Senado. Os seguranças foram rigorosos na entrada. O detector de metais soou várias vezes. Diz-se que, na revista, até as ceroulas do depoente foram apalpadas. Não havia nenhum assessor esperando por Cerveró. Ele teve de se virar sozinho para achar, a muito custo, a sala da CPI.
À boca miúda, informa-se que, encerrada a sessão, um auxiliar da CPI tocou o telefone para a companhia aérea. Deu instruções draconianas: "Na viagem de volta, a mesma poltrona. Última fileira. E nada de barrinha de cereais. Está pensando o quê?"
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.