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Publicidade de Dilma se apossa da Ficha Limpa

Josias de Souza

02/10/2014 03h48

Ficha Limpa: projeto chega à Câmara, em setembro de 2009, 'escoltado' por 1,3 milhão de apoios

Nascida de uma mobilização popular que resultou na coleta de 1,3 milhão de assinaturas, a Lei da Ficha Limpa vem sendo mencionada na propaganda eleitoral de Dilma Rousseff como se fosse uma iniciativa do governo. As referências constam de comerciais e textos nos quais o marketing da campanha tenta vender a ideia de que as administrações petistas sempre combateram a corrupção de forma implacável.

Num dos seus programas eleitorais, Dilma caprichou na pose: "Um tema me causa muita revolta e imensa repulsa: a corrupção." No vídeo, ela diz ter ampliado "um esforço que já vínhamos fazendo desde o governo Lula, fortalecendo a Polícia Federal e todos os órgãos de controle e fiscalização." Enumerou as providências resultantes do "esforço". Em dado momento, ela declara: "aprovamos a Lei da Ficha Limpa" (no vídeo, disponível aqui, a frase aparece na altura de 1min30s.)

A lei de iniciativa popular foi citada também num texto veiculado há dois dias no site oficial da campanha de Dilma. Foi escrito para apresentar um "novo vídeo sobre Dilma e o combate à impunidade." Na peça, a marquetagem petista bate bumbo em torno de cinco projetos de lei que a presidente anunciara no último final de semana. Coisa retirada de uma espécie de agenda secreta, conforme já comentado aqui.

Pois bem. Após esmiuçar as cinco iniciativas, o texto anota: "Essas propostas são a continuidade das diversas ações de combate à corrupção tomadas ao longo dos governos do PT." Na lista de ações, encontra-se novamente a "Lei da Ficha Limpa" (o texto pode ser lido aqui. A menção imprópria consta do penúltimo parágrafo).

A tese de que Dilma e os governos do PT têm algo a ver com o nascimento da Lei da Ficha Limpa é tão válida quanto uma insinuação de que a candidata à reeleição ajudou a escrever as partituras das nove sinfonias de Beethoven. A proposta de iniciativa popular aportou na Câmara em setembro de 2009. Perambulou durante nove meses.

Sob pressão das ruas e das manchetes, o projeto foi aprovado, com ajustes, pela Câmara e, depois, pelo Senado. Virou a Lei Complementar 135/2010. Foi sancionada em 4 de junho de 2010, ainda sob Lula. Ao incluir a obra coletiva no rol de realizações do governo do PT, Dilma conta algo que o poeta gaúcho Mario Quintana classificaria de "uma verdade que esqueceu de acontecer."

Não fica bem. Subretudo quando se recorda que Dilma acaba de acusar a rival Marina Silva de mentir sobre o voto contrário à CPMF que deu na época em que era senadora.

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.


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