Renan devolve MP que eleva tributo sobre folha
Josias de Souza
03/03/2015 19h06
Menos de 24 horas depois de ter faltado a um jantar oferecido por Dilma Rousseff à cúpula do PMDB, o presidente do Senado, Renan Calheiros, anunciou em plenário a devolução de uma medida provisória editada pela presidente na última quinta-feira. Trata-se da MP que elevou a contribuição previdenciária sobre a folha de pagamento de 56 setores da economia. "É inconstitucional", sentenciou Renan.
Por quê? "O Poder Executivo, ao abusar das medidas provisórias, que deveriam ser medidas excepcionais, deturpa o conceito de separação dos Poderes, invertendo os papeis constitucionalmente talhados a cada um dos Poderes da República", disse Renan. "Assim, o excesso de medidas provisórias configura desrespeito à prerrogativa principal deste Senado Federal."
Pela constituição, as MPs precisam ser urgentes e relevantes. Renan declarou que, ao analisar a medida provisória que reduziu a desoneração da folha salarial, concluiu que "não se pode considerar como urgente a alteração de alíquotas de contribuição previdenciária cuja vigência, por força constitucional, teria de aguardar o prazo de 90 dias."
Renan concluiu: "Esta matéria poderia ser perfeitamente veiculada por projeto de lei de iniciativa da presidente, que ainda dispõe a seu favor da possibilidade da urgência constitucional. Por esta razão, considero a medida provisória inconscitucional."
Ironicamente, a MP devolvida por Renan alterou alíquotas previdenciárias que haviam sido fixadas em 2011 por meio de outra medida provisória. Presidia o Senado na época o mesmo Renan Calheiros. Que não enxergou na peça o mesmo vício da inconstitucionalidade. O paradoxo deixa claro que a posição adotada agora por Renan não é técnica, mas política.
A valentia institucional de Renan coincide com a confirmação de que o nome dele está mesmo na lista de políticos encrencados na Operação Lava Jato. Caberá ao ministro Teori Zavascki, do STF, decidir sobre os pedidos de abertura de inquérito contra Renan e outros políticos. No Planalto, acredita-se que Renan faz pose de oposicionista para forçar o governo a socorrê-lo. Algo que Dilma não parece ter condições de fazer.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.