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Em crise, PT perdeu o recato, o discurso e a rua

Josias de Souza

21/03/2015 05h20

Quando estourou o mensalão, o PT simulou desconforto. Chegou mesmo a encenar o expurgo do então tesoureiro Delúbio Soares dos seus quadros. Hoje, no auge do petrolão, o partido não consegue exibir nem mesmo um mal-estar fingido. Perdeu inteiramente o recato.

Quando a cúpula do PT foi parar na cadeia, o partido fez pose de vítima injustiçada. Hoje, com o tesoureiro João Vaccari Neto denunciado pela Procuradoria e o mito José Dirceu devolvido às manchetes policiais, a legenda finge-se de morta. O PT perdeu o discurso.

No primeiro mandato de Lula, quando a oposição ensaiou um coro de impeachment, o PT ameaçou convulsionar o asfalto. Há uma semana, o meio-fio rosnou para o petismo e pediu a saída de Dilma. O PT perdeu o monopólio da rua.

No comando do poder federal desde 2003, o PT atravessa a mais grave crise de sua curta existência de 35 anos. A legenda chega ao seu 5º Congresso, marcado para junho, de ponta-cabeça.

Considerando-se a pauta do Congresso —da "atualidade do socialismo petista" até "a economia política pós-neoliberal"— o PT está perdido. Não é que o partido não tenha farejado uma solução para o seu problema. Em verdade, o PT ainda não enxergou nem o problema.

O PT assiste à hemorragia da recém-instalada segunda administração de Dilma Rousseff com a passividade de quem se julga capaz de ressuscitar com Lula em 2018. Erro primário. Sem Dilma, pode não haver Lula daqui a três anos e nove meses.

Pregoeiro do "nós-contra-eles", o PT testemunha o crescimento do "quase-todos-contra-nós". Acusa os adversários de estimularem o ódio contra o PT. Mas esquece de levar em conta que o antipetismo é uma reação ao ódio destilado pelo PT.

O manual anticrise do PT está com o prazo de validade vencido. Qualquer um que não reze pelo catecismo da legenda é um lacaio da elite branca de olhos azuis. Mas a crise moral e a ruína política que fazem a caveira do PT não carregam as digitais da oposição. Com a imagem e as práticas estilhaçadas, o PT afunda sozinho.

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.


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