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Acordão é tema obrigatório na sabatina de Janot

Josias de Souza

26/08/2015 04h58

Janot esteve duas vezes com Dilma e fez dos encontros com o ministro Cardozo (Justiça) um hábito

O fantasma do acordão transformou a imaginação dos políticos de Brasília numa seara sombria dos piores temores. No subconsciente de cada um pulsa a secreta certeza de que Renan Calheiros uniu-se a Dilma Rousseff num conchavo. Nele, o mandachuva do Senado livra-se da Lava Jato e ajuda a inquilina do Planalto a sair do isolamento congressual que lhe ameaça o mandato. Rodrigo Janot frequenta esse enredo em duas posições. Numa, o procurador-geral da República pavimenta o conluio. Noutra, dinamita-o.

Por mal dos pecados, o doutor entrou em cena como se desejasse ladrilhar com pedrinhas de brilhante o caminho do acordão. O universo tem ministérios insondáveis. O comportamento de Janot é um deles. Mais difícil do que Renan passar pelo buraco da agulha é compreender por que o procurador-geral não puxou o lençol do fantasma do acordão, desnudando-o. Na sabatina desta quarta, os senadores têm a obrigação de descobrir por quê.

A Lava Jato espirrou óleo queimado no colarinho de cinco dezenas de políticos, dos quais 35 têm assento no Congresso. Entre eles os presidentes do Senado e da Câmara, Renan Calheiros e Eduardo Cunha. Agindo em dobradinha, a dupla adotou uma tática manjada. Primeiro, armavam emboscadas para Dilma no Legislativo. Depois, faziam pose de vítimas de uma hipotética perseguição governamental. Atacavam Janot como se ele fosse um boneco e o Planalto seu ventríloquo.

Súbito, um dos delatores da Lava Jato disse ter repassado a Cunha um propinão de US$ 5 milhões. Operou-se, então, a reviravolta: Renan tomou distância do colega da Câmara e se reaproximou de Dilma. Arrancou de seus aliados no TCU um adiamento da análise da prestação de contas do governo de 2014. Se forem rejeitadas, essas contas podem servir de pretexto para que a tuma de Cunha, de mãos dadas com a oposição, abra um processo de impeachment na Câmara.

Puxa daqui, estica dali, Dilma enviou para o Diário Oficial o ato de recondução de Janot à chefia do Ministério Público. Àquela altura, todos em Brasília recitavam os termos do acordão: Janot denunciaria Cunha ao STF, mas pouparia Renan. A recondução do procurador-geral seria aprovada sem dificuldades no Senado, que passaria a funcionar como uma espécie de escudo contra as ofensivas anti-Dilma da Câmara.

Afora Eduardo Cunha, Janot encaminhou ao Supremo apenas a denúncia contra o senador Fernando Collor. Repetindo: às voltas com 35 congressistas suspeitos de receber petropropinas, o procurador-geral pinçou apenas dois. A Comissão de Constituição e Justiça do Senado é um ótimo lugar para que Janot seja convidado a dar meia dúzia de explicações. Alguém precisa espremê-lo. E que não seja Collor, o reincidente.

Num ambiente em que Renan Calheiros faz pose de herói da resistência, é essencial que a plateia consiga distinguir os mocinhos e dos bandidos.

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.


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