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Relator das pedaladas é réu no STF: estelionato

Josias de Souza

22/10/2015 04h54

Escolhido para ser o relator do parecer do Tribunal de Contas da União que condenou as 'pedaladas fiscais' e rejeitou as contas do governo Dilma Rousseff do ano de 2014, o senador Acir Gurgacz, de Rondônia, é réu em processo que corre no Supremo Tribunal Federal. Responde por estelionato, artigo 171 do Código Penal, além de crimes contra o sistema financeiro nacional.

Investigado pela Polícia Federal e denunciado pela Procuradoria-Geral da República, Gurgacz foi convertido em réu no dia 10 de fevereiro de 2015. O relator da ação penal é o ministro Teori Zavascki, o mesmo que cuida dos processos da Lava Jato. A denúncia contra o senador foi aceita por unanimidade na 2ª turma do STF. Além de Zavascki, votaram os ministros Gilmar Mendes e Cármen Lúcia.

Gurgacz era sócio e diretor de uma empresa de ônibus chamada Eucatur. Operava em Manaus (AM) e Ji-Paraná (RO). Foi acusado de ludibriar uma casa bancária estatal, o Banco da Amazônia, para obter empréstimo de R$ 1,5 milhão. No papel, o dinheiro deveria ser usado na compra de sete ônibus novos, orçados em R$ 290 mil cada. Descobriu-se, porém, que foram adquiridos ônibus com quase onze anos de rodagem, ao preço de R$ 12 mil cada.

O ministro Teori Zavascki anotou no seu voto: "A materialidade e os indícios de autoria –elementos básicos para o recebimento da denúncia– encontram-se presentes. As provas indiciárias juntadas aos autos demonstram que, de fato, foi apresentada ao Banco da Amazônia documentação referente à aquisição de sete ônibus novos, com ano de fabricação 2004, o que levou a instituição a liberar R$ 1.522.500,00 na conta da empresa Eucatur. Todavia, descobriu-se mais tarde, em razão de informação da Delegacia Especializada em Acidentes de Trânsito de Manaus, que os veículos não haviam sido fabricados em 2004, mas sim em 1993."

Para que os ônibus velhos passassem por veículos novos, a empresa dirigida pelo senador apresentou documentos falsos ao Banco da Amazônia. O papelório frio incluía notas fiscais, faturas, recibos, certificados e registros dos ônibus.

Em sua defesa, Gurgacz alegou que era "sócio-cotista" da empresa, com "5% de quotas-parte". Sustentou que foi "apenas avalista do financiamento" bancário. De resto, ecoou alegações da empresa segundo as quais o dinheiro não foi desviado, mas usado na compra de ônibus e combustível. E reforçou o capital de giro da empresa.

No Senado, Acir Gurgacz é líder do PDT. Tomado pelos votos, é um governista de mostruário. Vota sempre guiando-se pelas orientações emanadas do Planalto. É contra o impeachment. Considerando-se o seu histórico, não são negligenciáveis as chances de o senador apresentar na Comissão de Orçamento do Congresso um voto a favor da aprovação das contas presidenciais de 2014, na contramão do que recomendou o TCU.

Deve-se à senadora Rose de Freitas (PMDB-ES), presidente da COmissão de Orçamento, a escolha de Gurgacz como relator das contas tisnadas pelas "pedaladas". O relator amistoso não foi a única boa notícia que Dilma recebeu nesta quarta-feira (21). Por decisão do presidente do Senado e do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL), o governo terá 45 dias para apresentar defesa prévia às acusações contidas no parecer do TCU.

A defesa do governo é conhecida. Já foi esmiuçada durante o julgamento da prestação de contas do governo no TCU, órgão auxiliar do Congresso. As alegações de Dilma, expostas em petições elaboradas pela Advocacia-Geral da União, podem ser manuseadas à vontade pelos congressistas.

A despeito de tudo isso, Renan criou um novo prazo para a defesa. No papel, quis assegurar ao governo o direito ao contraditório. Na realidade, pedalou o regimento para favorecer Dilma com o adiamento da análise das contas para 2016. Com sorte, a Comissão de Orçamento votará a matéria em março do ano que vem. Na sequência, o plenário do Congresso terá de se manifestar em sessão conjunta, com deputados e senadores. Cabe Renan marcar o dia da votação. Se ele estiver de bem com Dilma, as calendas gregas serão o limite.

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.


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