Senador diz ter poder para nomear até melancia
Josias de Souza
05/08/2016 15h51
Às vésperas do julgamento de Dilma Rousseff, o Diário Oficial da União tornou-se um território fértil para os senadores que se dispõem a votar a favor do impeachment. O senador Hélio José (PMDB-DF), por exemplo, acomodou no comando da Superintendência do Patrimônio da União do Distrito Federal, órgão vinculado ao Ministério do Planejamento, um assessor chamado Francisco Nilo Júnior. Os servidores do órgão não gostaram. Abespinhado, o senador foi à repartição na última terça-feria (2). E avisou aos descontentes: "Isso aqui é nosso. Isso aqui eu ponho quem eu quiser aqui. A melancia que eu quiser aqui eu vou colocar!"
Por mal dos pecados, um dos servidores presentes à reunião gravou a manifestação do senador. O áudio ganhou a internet. Quem ouve fica com a impressão de que o orador instalou uma porteira na entrada da SPU, responsável pela administração dos imóveis e das terras da União no Distrito Federal. A certa altura, o orador explica que plantou Francisco Nilo na SPU porque "ele tem lado." Deixou claro que sua melancia é fiel: "O lado dele é o senador Hélio José, que é o responsável pela SPU a partir de hoje. A partir de hoje, a SPU é responsabilidade minha, do senador Hélio José, gabinete 19, da [ala] Teotônio Vilela." (Ouça as declarações do Senado no vídeo abaixo):
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Hélio José é um nômade partidário. Filiado ao PT, mudou-se para o PSD depois que o roçado do petismo foi atacado pela praga do petrolão. Sem votos, Hélio José ganhou uma cadeira de senador como suplente de Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), eleito governador do DF em 2014. Homem de visão, Hélio José trocou o PSD pelo PMB, Partido da Mulher Brasileira. Há cinco meses, como que farejando o que estava por vir, o personagem migrou para o PMDB de Michel Temer.
Antes de ser terceirizada a Hélio José, a Superintendência do Patrimônio da União era controlada pelo diretório brasiliense do PT, o antigo partido do senador. Os servidores reagiram à chegada de Francisco Nilo sob a alegação de que o apadrinhado do senador é dono de uma imobiliária. Algo que faria dele uma espécie de Drácula em banco de sangue, já que a principal atribuição da SPU é gerir o patrimônio imobiliário da União. Em nota, Hélio José negou que seu pupilo seja proprietário de imobiliária.
O senador enxerga conspiração política na reação dos servidores da SPU. Responsabiliza pela difusão de informações desabonadoras sobre seu apadrinhado a servidora Valéria Veloso, que respondia pela SPU como superintendente substituta.
"Eu vou pra Casa Civil agora pra resolver esse negócio dessa imobiliária", disse Hélio José na reunião de terça-feira, sem saber que estava sendo gravado. "É mais uma armação de Valéria e companhia limitada e não vai acontecer, tá certo? Nao vai acontecer." Foi nesse ponto que o senador mencionou os poderes extraordinário que julga ter na Casa Civil de Michel Temer: "Isso aqui é nosso. Isso aqui eu ponho quem eu quiser aqui. A melancia que eu quiser aqui eu vou colocar."
Hélio José soou categórico: "Por isso que quem é do time adversário tá fora, tá certo? Tá for a! Peço, por gentileza, que sua Valéria esvazie sua gaveta e sua turba e caia fora daqui, certo? E caia fora daqui, por favor. Tô deixando isso claro, tô deixando isso claro, bem registrado aqui, bem claro em alto e bom som: sua Valéria e sua turma de conspiradores esvaziem as gavetas e caia fora da SPU. E vai lá se apresentar na seção de pessoal do Ministério do Planejamento, pra ver aonde vai se lotar esse povo lá."
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.