Tape o nariz pelo bem da República, pede o TSE
Josias de Souza
24/03/2017 21h12
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Ao empurrar os depoimentos dos delatores da Odebrecht para dentro do processo sobre a cassação da chapa vitoriosa nas eleições presidenciais de 2014, o relator do caso, ministro Herman Benjamin, ofereceu ao Tribunal Superior Eleitoral a oportunidade de fazer história. São eloquentes as evidências de que passaram pela caixa registradora da campanha de Dilma Rousseff e de Michel Temer verbas sujas saídas do departamento de propinas da maior empreiteira do país.
Pela lei, os ministros do TSE teriam duas providências a adotar. Primeiro, interromper a presidência-tampão de Michel Temer, cassando-lhe o mandato. Depois, decretar a inelegibilidade de Dilma Rousseff. Mas no Brasil, Deus às vezes dá toga a quem não tem coragem de julgar. Arma-se na Corte Eleitoral um conchavo para deixar tudo como está, para ver como é que fica.
Alguns ministros do TSE sustentam a tese de que é preciso aplicar às culpas que saltam do processo uma avaliação atenuatória que leve em conta as consequências danosas de uma eventual cassação de Temer. Por esse raciocínio, o país não suportaria uma segunda destituição de presidente em tão pouco tempo. A tese tem dois problemas: 1) Passa a impressão de que a lei é dura, mas estica. 2) Subestima a inteligência do brasileiro.
Inédito, o processo do TSE contra uma chapa presidencial poderia representar um marco saneador. Mas em vez de promover a limpeza, fixando novos parâmetros de assepsia, a turma do deixa-disso prefere acomodar o lixo sob o imenso tapete nacional. O TSE pede aos brasileiros que tapem o nariz em nome da estabilidade da República. O Brasil virou um país inusitado. Nele, todos vêem o problema. Mas ninguém quer enfrentá-lo. Apesar de tudo, o país tem saída. Ainda não roubaram o Aeroporto Internacional de Cumbica.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.