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Joesley: áudio-pastelão é ‘conversa de bêbado’

Josias de Souza

08/09/2017 05h44

Em depoimento à Procuradoria-Geral da República, o empresário Joesley Batista chamou de "conversa de bêbado" o teor do autogrampo-pastelão que pode enviá-lo para a cadeia. Com a imunidade penal por um fio, o dono da JBS revelou-se durante o depoimento um personagem em apuros. Submeteu a procuradora da República encarregada de interrogá-lo a quase três horas de explicações que serviram apenas para deixar claro que não tinha nada a dizer.

Joesley admitiu ter conversado com o ex-procurador Marcelo Miller num período em que ele ainda era membro da força-tarefa da Lava Jato em Brasília. Mas jurou que o doutor não fez jogo duplo, ensinando-lhe os caminhos que levavam a Rodrigo Janot e à delação dos sonhos.

Impossível ouvir as pseudo-explicações de Joesley sem ficar com sensação de que, sob o seu exterior meio idota, se esconde um espertalhão que supõe estar falando para débeis mentais completos. A impressão de que o depoente tenta fazer todo mundo de idiota aumenta quando se recorda um trecho da conversa que ele manteve com seu executivo Ricardo Saud. Vai reproduzido abaixo:

Joesley: "Por isso é que eu quero que nós dois temos que estar 100% alinhado. Nós dois e o Marcelo [Miller], entendeu? É, mas nós dois temos que operar o Marcelo direitinho para chegar no Janot e pá. Porque nós temos que… eu acho, é o que eu falei pra Fernanda [Tortima, advogada da JBS], é o que eu falei pro… Nós nunca podemos ser o primeiro. Nós temos que ser o último. Nós não podemos ser."

Saud: "A tampa do caixão."

Joesley: "Nós temos que ser a tampa do caixão. Falei pra Fernanda: 'Fernanda, nós não vamos ser nunca quem vai dar o primeiro tiro. Nós vai ser quem vai dar o último tiro. Vai ser quem vai bater o prego da tampa'."

Noutro trecho da conversa que, por inexplicável, tornou-se auto-explicável, Joesley se refere a Rodrigo Janot como se o procurador-geral da República fosse, por assim dizer, um boneco de ventríloquo.

Joesley: O Janot sabe tudo! Janot… A turma já falou pro Janot.
Saud: Você acha que o Marcelo [Miller] tá levando tudo pra ele?
Joesley: Não, não é o Marcelo. Nós falamos pro…
Saud: Anselmo.
Joesley: Pro Anselmo, o Anselmo que falou pro [Eduardo] Pelella [chefe de gabinete de Janot], que falou pro não sei que lá, que falou pro Janot, o Janot tá sabendo. Aí o Janot, espertão, o que o Janot falou: "Bota pra foder, bota pra foder. Põe pressão neles pra eles entregar tudo". Mas não mexe com eles. "Pra foder, dá pânico neles!", mas não mexe com ele.

Inquirido na Procuradoria sobre o trecho do áudio em que manifesta a intenção de usar o ex-ministro petista José Eduardo Cardozo como portal de acesso a segredos capazes de enlamear ministros do Supremo Tribunal Federal, Joesley disse algo assim: dar crédito a tais sandices seria o mesmo que acreditar em dois bêbados falando sobre a capacidade bélica da Coreia do Norte para invadir os Estados Unidos.

Suprema ironia: ao se auto-desmoralizar no depoimento desta quinta-feira, Joesley acabou levando água para o moinho de Michel Temer. Numa das entrevistas que concedeu para tentar explicar o diálogo desqualificado que mantivera com Joesley no subsolo do Jaburu, o presidente da República disse meia dúzia de palavras sobre o trecho em que Joesley diz que estava comprando autoridades:

"Não dei a menor atenção a isso", declarou Temer. "Ele falou que tinha [comprado] dois juízes e um procurador. Conheço o Joesley de antes desse episódio. Sei que ele é um falastrão, uma pessoa que se jacta de eventuais influências. E logo depois ele diz que estava mentindo."

Por sorte, Rodrigo Janot sinaliza a intenção de cancelar a imunidade que concedeu a Joesley e Cia, além de requerer um par de mandados de prisão. A essa altura, se o procurador-geral se animasse a dar crédito ao lero-lero da "conversa de bêbado", se arriscaria a transformar a denúncia que formulou contra Temer em obra de um ébrio. Nessa hipótese, Janot já teria o que fazer depois que deixasse o cargo. Preencheria o tempo ocioso frequentando as reuniões de um grupo dos Alcoólicos Anônimos.

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.


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