Entregar sindicatos a Moro não faz nenhum nexo
Josias de Souza
03/12/2018 16h34
Ministro Extraordinário da Transição e futuro chefe da Casa Civil, o deputado Onyx Lorenzoni confirmou que Jair Bolsonaro decidiu extinguir o Ministério do Trabalho, distribuindo suas atribuições entre outras três pastas: Economia, Cadadania e Justiça. A tentar explicar a lógica que estaria por trás da decisão, Onyx tropeçou nas primeiras palavras. Deu-se no exato instante em que justificou a ideia de enfiar um pedaço da estrutura do Trabalho dentro da estrutura da Justiça.
Nas palavras de Onyx, a parte que ficará com Sergio Moro "é aquela ligada à concessão de carta sindical". Uma área em que "a imprensa já registrou problemas e casos de corrupção." Se for tomado ao pé da letra, o critério mencionado pelo ministro justificaria a extinção de algo como 80% da Esplanada dos Ministérios, pois a corrupção, por endêmica, contaminou quase todo o organograma do Estado.
É verdade que o Ministério do Trabalho virou um balcão a serviço dos partidos. Sob Lula e Dilma, serviu ao PT e ao PDT. Sob Temer, foi capturado por PTB e Solidariedade. Está em pleno andamento a Operação Registro Espúrio, na qual a Procuradoria e a Polícia Federal varejam um esquema de troca de registros sindicais por propina. Mas isso não justifica a conversão dos sindicatos num tema exclusivamente policial.
Sergio Moro, como futuro superior hierárquico da PF, poderia acompanhar o andamento da denúncia que encrencou figurões como Roberto Jefferson (PTB) e Paulinho da Força (Solidariedade) sem que o futuro dos sindicatos tivesse que ficar relegado a plano secundário na pasta da Justiça. Do contrário, Bolsonaro teria de anunciar a extinção do próprio Ministério da Economia.
Entre os personagens pilhados na Lava Jato estão os ex-ministros Antonio Palocci e Guido Mantega, que comandaram a economia na era petista. As investigações revelam que ambos transformaram a área econômica num balcão hipertrofiado, sobre o qual se vendia tudo —de medidas provisórias com benefícios fiscais e empréstimos do BNDES com juros companheiros. Se Sergio Moro virou o Posto Ipiranga para assuntos de ladroagem, por que não confiar a ele também o Ministério da Economia?
Certas decisões reforçam a impressão de que o planejamento do futuro governo é incapaz de resolver alguns problemas. Mas revela-se genial na organização das próximas confusões.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.