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Ministra-pastora avalia que as instituições piraram e igreja deve governar

Josias de Souza

07/12/2018 05h53

Para a mais nova ministra da equipe de Jair Bolsonaro, a pastora evangélica Damares Alves, "as instituições estão todas piradas" no Brasil. Ela avalia, entretanto, que "há uma instituição que não pirou: a igreja de Jesus". Não restou à nação senão a alternativa de confiar nas denominações evangélicas. Damares sentencia: "Chegou a nossa hora. É o momento de a igreja ocupar a nação. É o momento de a igreja governar. Se a gente não ocupar esse espaço, Deus vai cobrar da gente."

A pastora ocupará o seu espaço no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. Suas palavras, pronunciadas em maio de 2016, numa pregação para fiéis da Igreja Batista da Lagoinha, em Belo Horizonte, soaram proféticas. Dois anos e meio depois, Damares virou ministra de um presidente que deseja governar com a frente evangélica. Uma bancada que diz representar igrejas situadas em pedaços do mapa onde nem o MDB, com sua decantada capilaridade, sonhou montar um diretório.

O sermão da pastora Damares está disponível no Youtube (veja aqui). Tem uma hora e meia de duração. Vale o desperdício de um pedaço do final de semana. Quem assiste se depara com uma personagem dos novos tempos. Dona de fala fácil, Damares mistura política e religião num culto eletrizante.

Se ouvisse Damares, o ministro Ricardo Lewandowski talvez mandasse chamar a Polícia Federal. Além do Executivo e do Legislativo, também "o Judiciário está falindo", sustenta a nova ministra. Por quê? "Onze ministros que não foram nem eleitos pelo povo brasileiro vão decidir se a gente libera ou não o consumo de drogas no Brasil. Palhaçada!" Decidirão também "se os travestis e transexuais vão ou não usar os banheiros de nossas meninas."

No país de Damares, a família tradicional e suas crianças são assediadas por muitos fantasmas. "Estão confundindo a fé de nossas crianças no Brasil. As bíblias foram expulsas das escolas, porque eles dizem que o Estado é laico. Tem professores sendo processados no Brasil porque oram o Pai Nosso em sala de aula. Não se pode mais falar de Deus nas escolas."

O que tira Damares do sério é a percepção de que o Estado brasileiro só é laico para os evangélicos. "Temos leis que obrigam o ensino da cultura afro e da cultura indígena nas escolas. OK, legal. Mas fomos atrás do material (didático) e descobrimos que estão burlando a lei. Não estão ensinando cultura afro. Estão ensinando religião afro nas escolas, desrespeitando a fé das crianças cristãs."

Pelos critérios de Bolsonaro, Damares teria perfil até para a pasta da Educação. "As bíblias vão ter que voltar para as escolas no Brasil", declarou a agora ministra para os fiéis mineiros. Ela também pega em lanças contra o que se convencionou chamar de "ideologia de gênero." Exibiu para os fiéis imagens de supostos livros didáticos que deixariam o capitão-presidente de cabelos hirtos.

Intercalando frases ácidas com a exibição de imagens num telão, Damares queixou-se de um "desenho animado no SBT em que as crianças são duas lésbicas." Reclamou "do que fizeram com os príncipes" nos contos de fada. "Aladim apaixonado por outro homem…" Mais: "o príncipe não acorda mais a Cinderela com beijo, porque o príncipe virou gay." Pior: "Agora vai ter um desenho animado em que a princesa Aurora, do Frozen, vai acordar a Bela Adormecida com um beijo lésbico."

Como diz o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo, a pastora Damares talvez esteja se assustando com as assombrações erradas. O problema é que Deus, embora seja onipresente, já não consegue ser full time. É evidente que Ele vai cuidar de outras coisas quando Bolsonaro escolhe novos ministros.

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.


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