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Superexposição de Mourão aborrece Bolsonaro

Josias de Souza

22/12/2018 04h23

A desenvoltura do vice Hamilton Mourão provoca um aborrecimento crescente em Jair Bolsonaro. O capitão gostaria que o general evitasse a superexposição, migrando da vitrine para o fundo do novo governo. Embora já tenha sinalizado o seu desgosto, acha que não foi compreendido adequadamente.

Com a franqueza que lhe é peculiar, Mourão não costuma fugir de temas encrespados. Sobre a suspeita de caixa dois que ronda o futuro chefe da Casa Civil Onyx Lorenzoni, disse: "Uma vez que seja comprovado que houve a ilicitude é óbvio que o ministro Onyx terá que se retirar do governo…"

Instado a opinar sobre a movimentação bancária atípica de R$ 1,2 milhão do ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro, Mourão foi ao ponto: "O ex-motorista [Fabrício Queiroz], que conheço como Queiroz, precisa dizer de onde saiu este dinheiro. O Coaf rastreia tudo. Algo tem, aí precisa explicar a transação, tem que dizer."

Mourão animou-se até a avaliar o comportamento do próprio Jair Bolsonaro, arrastado para o epicentro do caso graças a um cheque de R$ 24 mil que migrou da conta tóxica de Queiroz para a conta da futura primeira-dama Michelle Bolsonaro. "Ele demorou a falar. Podia ter falado antes", mordeu o vice, antes de soprar: "Esperou aumentar a pressão. Mas acho que falou bem."

Num instante em que Bolsonaro acarinha Israel, acenando com a intenção de mudar a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém, Mourão faz média com a comunidade árabe. Nesta semana recebeu uma delegação da Câmara de Comércio Árabe Brasileira. "…Conversamos sobre as possibilidades de comércio e investimentos no Brasil dos 22 países árabes representados pelo órgão", prestou contas no Twitter.

Assim como a Presidência, a vice-presidência será aquilo que o seu titular quiser fazer dela. Mourão já teve a oportunidade de esboçar o perfil que planeja ostentar. Não cogita ser um vice "decorativo", como Michel Temer se autodefiniu em carta que endereçou a Dilma Rousseff antes de redecorar a cena política que arrastou a então presidente petista para o impeachment.

"Não vamos receber ninguém na garagem à meia-noite", costuma dizer Mourão, evocando o encontro em que a voz de Temer foi captada por Joesley Batista, o dono da JBS, no célebre grampo do Jaburu. Mourão também já teve a oportunidade de declarar que planeja ser uma mistura do insosso Marco Maciel com o apimentado Aureliano Chaves:

"O Marco Maciel era uma pessoa extremamente discreta, um político hábil. É um bom exemplo de vice-presidente. O Aureliano era um pouquinho mais audaz. Mas é também um bom exemplo para ser seguido. Aureliano era político. Eu acabo aprendendo."

De resto, o general-vice vem repetindo à exaustão que ninguém conseguirá intrigá-lo com o capitão-presidente, pois ele será "o escudo e a espada de Bolsonaro." Considerando-se o desassossego que a movimentação de Mourão provoca, Bolsonaro parece enxergá-lo como uma espécie de São Jorge que sai com a missão de salvar a donzela e acaba se casando com o dragão.

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.


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