Enrosco de Flávio Bolsonaro contamina governo
Josias de Souza
21/01/2019 21h40
É grande o esforço do Planalto para dissociar Jair Bolsonaro e seu governo do enrosco em que se meteu o senador eleito Flávio Bolsonaro. O vice-presidente Hamilton Mourão, agora no exercício da Presidência, disse que o caso que envolve o filho mais velho do presidente "não tem nada a ver com o governo". Para o general Mourão, a encrenca "cria algum problema familiar, mas não para o governo." Lamentavelmente, não é bem assim.
A coisa funciona segundo a lógica exposta na música de Claudinho e Bochecha, interpretada por Adriana Calcanhoto. Jair Bolsonaro sem Flávio Bolsonaro seria como "avião sem asa, fogueira sem brasa, futebol sem bola, Piu-piu sem Frajola." Políticos como os da dinastia Bolsonaro, que se vendem como protótipos da moralidade, convivem permanentemente com o risco de que, a qualquer momento, os fatos desautorizem o discurso.
Há três meses, Flávio Bolsonaro borrifava detergente no noticiário político. Ele dizia: "Não há a menor condição de apoiar Renan Calheiros para a presidência do Senado". Afirmava também que "o novo momento do Brasil pede um presidente inédito" na Câmara, não Rodrigo Maia. Hoje, o Planalto está fechado com a reeleição de Maia na Câmara. E Renan estende a mão para o filho do presidente, às voltas com o risco de estrear no Senado como protagonista de uma CPI.
Flávio Bolsonaro não aproveitou adequadamente as oportunidades que teve para se distanciar do amigo e ex-assessor Fabrício Queiroz, o correntista atípico do Coaf. E acabou virando uma oportunidade que os políticos se equipam para aproveitar no balcão em que serão expostas reformas como a da Previdência. Com sua própria movimentação bancária lançada no caldeirão da suspeição, o primeiro filho de Bolsonaro repete uma velha coreografia: agarra-se ao foro privilegiado, tenta anular provas, queixa-se de perseguição e oferece a sua "verdade" em conta-gotas. O país conhece esse filme. Mantido o enredo, o final pode não ser feliz.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.