Barroso: 'Estrutura da Justiça Eleitoral para julgar crimes é inexistente'
Josias de Souza
16/03/2019 03h25
Ministro do Supremo e vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral, o ministro Luís Roberto Barroso comparou os meios de que dispõem as varas federais e as zonas eleitorais no Paraná, berço da Lava Jato. Os dados reforçaram sua convicção de que "a estrutura da Justiça Eleitoral para enfrentar a criminalidade institucionalizada no Brasil, quando esteja associada a delitos eleitorais, é inexistente."
Sem mencionar nomes, Barroso ironizou, em declaração ao blog, as previsões segundo as quais a decisão tomada pela Suprema Corte na última quinta-feira dará maior celeridade ao julgamento dos casos de corrupção.
"Há quem diga que a Justiça Eleitoral seria mais eficiente no julgamento de crimes do que a Justiça Federal. Se assim fosse, os advogados que tentaram aflitivamente transferir o caso da Justiça Federal para a Eleitoral, estariam traindo o mandato de seus clientes", afirmou Barroso. "De fato, se passassem o caso para uma Justiça que pode julgá-los e condená-los mais rapidamente, estariam atuando de modo contrário aos seus clientes. Evidentemente, não é assim. Todo mundo sabe o que está acontecendo aqui."
Horas antes, de passagem pela cidade de Salvador, o presidente do Supremo, Dias Toffoli, dissera o seguinte: "Não há que se falar que a Justiça Eleitoral não tem estrutura. Muito pelo contrário. Ela é a mais rápida, mais célere e tem prestado grandes serviços à história do Brasil, pacificando a sociedade brasileira."
Barroso compôs a minoria no julgamento em que a Suprema Corte decidiu por 6 votos a 5 transferir para a Justiça Eleitoral os processos em que crimes como corrupção e lavagem de dinheiro aparecem junto com o caixa dois eleitoral. Ironicamente, a ministra Rosa Weber, que acumula a cadeira no Supremo com a poltrona de presidente do TSE, também votou contra a primazia atribuída à Justiça Eleitoral para julgar crimes comuns, quando acompanhados de delitos eleitorais.
Barroso não questiona a competência da Justiça Eleitoral. Apenas realça que ela não foi equipada para lidar com crimes comuns. Manuseando os dados comparativos do Paraná, Barroso disse durante a sessão do Supremo que "existem no Estado 70 varas federais —14 são varas exclusivas para matéria criminal." A 13ª vara federal de Curitiba, "atua nos crimes contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro cometidos por organizações criminosas."
"Cada vara da Justiça criminal tem a lotação de 14 servidores ocupantes dos cargos de analistas judiciários e de técnicos judiciários", declarou o ministro, antes de empilhar as atribuições dessas varas federais: "Além da parte jurisdicional propriamente dita, exercem inúmeras atribuições de ordem administrativa ou de apoio. Por exemplo: controle de bens apreendidos, armazenamento e encaminhamento dos instrumentos de produtos do crime, prestação de informações ao Conselho Nacional de Justiça sobre interceptações telefônicas e mandados de prisão e controle do cumprimento de penas substitutivas das penas privativas de liberdade"
Na sequência, Barroso comparou: "A Justiça Eleitoral de primeiro grau é organizada em zonas eleitorais. A imensa maioria das zonas elitorais no Brasil tem lotação de um técnico judiciário e um analista judiciário. Portanto, nós vamos transferir para essa estrutura inexistente a competência para enfrentar a criminalidade institucionalizada no Brasil, quando associada a delitos eleitorais. Não será uma transformação para melhor."
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
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