Capitão sabe criar crises, não sabe desfazê-las
Josias de Souza
25/03/2019 23h50
Há presidentes da República que têm dificuldades de lidar com as crises. Há outros que têm o talento para administrar as crises. Jair Bolsonaro revela-se um tipo sui generis de presidente. Ele é a própria crise. Sob o capitão, a Presidência transformou-se num outro nome para encrenca. O Planalto produz crises com a mesma naturalidade com que a bananeira dá bananas.
Em meio ao estilhaçamento de suas relações com Rodrigo Maia, presidente da Câmara, Bolsonaro reuniu-se com seus principais conselheiros civis e militares. Delegou a Onix Lorenzoni, chefe da Casa Civil, a tarefa de pacificar as relações com o Congresso. Numa única decisão, Bolsonaro cometeu dois equívocos. Errou ao imaginar que um presidente pode terceirizar a resolução de uma crise. Errou também ao supor que Onyx, parte do problema da articulação política, pode virar solução.
Um presidente deve identificar os buracos e desviar o governo deles. Com o auxílio dos filhos, Bolsonaro dedica-se a cavar os buracos nos quais sua administração cai. Iniciada uma crise, o presidente deve preservar os aliados e estancar a sangria. Carlos Bolsonaro, o filho do rei, comprou briga com o aliado Maia. E o capitão comportou-se como se quisesse ver o sangue de Maia escorrendo nas redes sociais mantidas por suas milícias virtuais.
Bolsonaro faria um favor a si mesmo se desperdiçasse cinco minutos do seu tempo para dimensionar o custo dessa penúltima crise em que se meteu. O eventual naufrágio da reforma da Previdência influenciará mortalmente os rumos do seu governo. O presidente repete o bordão segundo o qual não deseja incorrer na "velha política". Faz bem. Mas precisaria demonstrar que sua "nova política" não é o pão dormido que aparenta ser. Por ora, o que deu para perceber é que Bolsonaro sabe criar crises, mas não sabe como desfazê-las.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.