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Silêncio de Bolsonaro sobre execução de músico piora o que já é deplorável

Josias de Souza

10/04/2019 19h38

Há dois Bolsonaros na praça. Um é rápido. Outro, lento. O primeiro levou poucas horas para festejar, em 4 de abril, a ação policial em que agentes da Rota passaram nas armas 11 bandidos que tentavam assaltar dois bancos na cidade de Guararema, em São Paulo. "Parabéns aos policiais da Rota", apressou-se em escrever o presidente nas redes sociais. "Onze bandidos foram mortos e nenhum inocente saiu ferido. Bom trabalho", ele declarou.

O segundo Bolsonaro, o lento, não disse uma palavra sobre a lambança que uma patrulha do Exército fez no Rio de Janeiro no último domingo. Os soldados crivaram de balas o carro do músico Evaldo Rosa. Ele se dirigia a um chá de bebê. Estavam com ele no carro uma mulher, um idoso e duas crianças. Foram disparados 80 tiros. Evaldo morreu. Vai fazer uma semana e o capitão não deu um pio. Nem nas redes sociais nem fora delas.

Além de ser executado, Evaldo foi chamado de criminoso pelo Comando Militar do Leste. Em nota oficial, a unidade do Exército acusou o músico de atirar contra a patrulha, que reagiu "à injusta agressão." Era notícia falsa, admitiria o Exército na manhã seguinte, antes da prisão de uma dezena de soldados. E Bolsonaro ainda não reprovou a execução. Tampouco deu pêsames à família. Nada.

Bolsonaro, como se sabe, defende que policiais civis e militares tenham liberdade para matar bandidos sem sofrer punição. Sergio Moro incuiu no seu pacote anticrime a regra segundo a qual um juiz pode deixar de impor penas a agentes públicos quando o "excesso (pode me chamar de tiro) decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção".

Se fosse um presidente razoável, Bolsonaro já teria declarado que uma família a caminho de um chá de bebê não inspira "medo" ou "surpresa" capaz de produzir a "violenta emoção" de 80 tiros. O silêncio do capitão soa como aval, piorando uma situação que já é deplorável.

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.


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