Lula agora manipula até as próprias afirmações
Josias de Souza
03/05/2019 20h23
Lula sempre manipulou habilmente as declarações alheias. Agora, falseia até suas próprias afirmações. Na sua primeira entrevista como presidiário, declarou: "Não trocarei a minha dignidade pela minha liberdade." Na segunda entrevista, dessa vez ao jornalista Kennedy Alencar, ajustou o discurso para admitir o óbvio: equipa-se para solicitar a progressão de regime que levará à abertura de sua cela.
"Obviamente, quando os meus advogados disserem ´Lula, você pode sair´, eu vou sair. Só sairei daqui se qualquer coisa que tiver que tomar decisão não impedir de eu continuar brigando pela minha inocência."
Ainda que desejasse, Lula não poderia trocar a dignidade pela liberdade. Primeiro porque perdeu a dignidade ao cometer os crimes que o levaram à prisão. Segundo porque sua passagem do regime fechado para o semiaberto não é matéria sujeita ao escambo, depende da aplicação da legislação.
Num país submetido ao Estado de Direito, jamais será sonegado a um condenado o sacrossanto direito de defesa. A alegada "inocência" de Lula perdeu o prazo de validade quando sua culpa foi ratificada na terceira instância do Judiciário. Mas ao dizer que não abre mão de "continuar brigando", o preso como que desmente afirmações anteriores, nas quais tratava o Judiciário como parte de um grande complô político.
Lula costuma dizer que, quando puder, voltará a percorrer o país. Talvez não tenha a oportunidade de expor seu discurso desconexo a plateias companheiras cada vez menores. Está a caminho uma segunda condenação em segunda instância, referente ao caso do sítio de Atibaia. Somando-se as penas, Lula voltará para o regime fechado antes de se acostumar com as vantagens do semiaberto ou os confortos da prisão domiciliar.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.