Dúvida: STF ou STL, Supremo Tribunal do Lula?
Josias de Souza
07/08/2019 18h47
Com a rapidez de um raio, o plenário do Supremo Tribunal Federal suspendeu a ordem judicial de transferência de Lula da sala especial de Curitiba para uma cela convencional de São Paulo. O placar foi de dez a um. Apenas Marco Aurélio Mello enxergou uma anomalia: antes de chegar ao Supremo, a petição contestando a decisão da juíza Carolina Lebbos, de Curitiba, deveria percorrer as instâncias inferiores do Judiciário, o TRF-4, o STJ e, só depois o Supremo.
Conforme já foi comentasdo aqui, a transferência de Lula é uma decisão correta tomada em hora errada. O episódio oferece mais uma oportunidade para discutirmos uma excrescência: o privilégio da prisão especial.
O ex-juiz Sergio Moro trancou Lula numa "sala reservada" da Polícia Federal em função da "dignidade do cargo" que o preso ocupou. Michel Temer, quando foi preso provisoriamente, também passou por uma sala especial da Policia Militar.
O juiz mineiro Luiz Carlos Rezende enviou o tucano Eduardo Azeredo para uma "sala de Estado Maior". Por quê? As penitenciárias mineiras "passam por problemas de toda sorte", escreveu o juiz. E Azeredo, figura de "inegável status", "ex-governador", merece "segurança individualizada", justificou o magistrado. Decisões desse tipo ajudam o brasileiro a enxergar mais uma velha anomalia nacional: a cana dos poderosos.
No Brasil, os criminosos são tratados conforme o status social e a graduação profissional. Um político poderoso ou qualquer cidadão com canudo universitário —médico, advogado, jornalista…— mata ou rouba uma e vai para uma prisão especial. Um jovem da periferia é flagrado com uma pequena quantidade de maconha e é enfiado numa cela superlotada, virando mão-de-obra para as facções criminosas.
Foi contra esse pano de fundo que o Supremo parou para suspender a transferência da divindade petista. Fica no ar uma dúvida: o nome da Corte é STF ou STL, Supremo Tribunal do Lula.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.