Bolsonaro promove strip-tease no PSL e fica nu
Josias de Souza
16/10/2019 23h28
Jair Bolsonaro revelou nos últimos dias um talento insuspeitado para um tipo de música especial: a percussão. Ele exibe uma habilidade extraordinária no manuseio do tambor. Como todo artista talentoso, Bolsonaro cultiva certas idiossincrasias. Ele não toca em qualquer palco. Ao exigir "transparência" do PSL, por exemplo, o presidente bate bumbo sob um enorme telhado de vidro.
Depois de abrir uma crise com o seu partido, Bolsonaro esclarece que não deseja controlar a legenda. Quer apenas transparência. Segundo ele, "o partido está com a oportunidade de se unir na transparência". Diz Bolsonaro: "Vamos mostrar as contas. […] O dinheiro é público. São R$ 8 milhões (do fundo partidário) por mês." Graças a Bolsonaro, o brasileiro descobriu que o imenso telhado de vidro é o melhor posto de observação para acompanhar a briga interna do PSL. É dali que o país assiste há uma semana ao strip-tease da virtude.
Os próprios correligionários cuidaram de lembrar a Bolsonaro que, antes de exibir transparência do partido, ele precisa levantar o tapete que esconde o enrosco do primogênito Flávio Bolsonaro, o cheque que caiu na conta da primeira-dama Michelle, o empréstimo mal explicado do próprio Bolsonaro para correntista atípico Fabrício Queiroz e os interesses que levam o presidente a contemporizar com o laranjal do ministro do Turismo Marcelo Álvaro Antônio.
Num ambiente assim, ao insinuar que a crise é coisa da imprensa, que só enxerga "coisa ruim", Bolsonaro transforma a política num outro ramo do humorismo. Por sorte, quem observa com atenção a gincana de lama que se desenrola no PSL percebe que o presidente não tem apenas o telhado de vidro. O paletó, a camisa e a calça também são feitas de vidro. O mais curioso é que são os próprios correligionários de Bolsonaro, não os oposicionistas, que avisam ao país que o rei está nu.
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.