O que só Bolsonaro sabe sobre o caso Marielle?
Josias de Souza
14/12/2019 02h19
O universo tem mistérios que jamais vamos entender. Um deles é essa mania que Jair Bolsonaro tem de oferecer matéria-prima para os que tentam, sem sucesso, entender os seus mistérios. O que leva o presidente a parar o carro oficial na frente do Palácio da Alvorada para despejar sobre microfones e gravadores uma frase como essa? "No caso Marielle, outras acusações virão. Armações! Vocês sabem de quem."
Sem dar nome aos bois, Bolsonaro soou como se apontasse a língua para Wilson Witzel. Isso porque, em outubro, o presidente acusou o o governador do Rio de Janeiro de "vazar informações" e "manipular" as investigações sobre o assassinato de Marielle Franco para incriminá-lo.
Naquela ocasião, irritado com uma reportagem da Rede Globo, Bolsonaro disse que, 20 dias antes da veiculação da notícia, recebera de Witzel a informação de que um porteiro havia enfiado seu nome no inquérito sobre a execução de Marielle Franco. Witzel desmentiu Bolsonaro. O porteiro se desdisse em novo depoimento. E ninguém falou sobre o assunto novamente.
De repente, Bolsonaro volta à carga para anunciar novas "armações". Na mesma aparição, o presidente disse a apoiadores que foram ao portão do Alvorada para festejá-lo que seu governo apresenta resultados, "apesar de grande parte da imprensa" e da "gente do mal".
Ora, um presidente que diz coisas definitivas sobre um assassinato —vêm aí novas armações contra mim—, mas não define muito bem as coisas, não precisa de imprensa ou de gente malévola para se enrolar. Bolsonaro tropeça na própria língua. Parece atormentado pela síndrome do que está por vir. E o país se pergunta: O que só Bolsonaro sabe sobre o caso Marielle?
Sobre o autor
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.
Sobre o blog
A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.