Acossado, Legislativo testa limites da República
Habituadas a participar de festas infantis, as crianças sabem como é arriscado soprar balões até que eles estourem na cara dos imprudentes. Acossados pela Lava Jato, os congressistas brasileiros decidiram testar os limites da República. Tentam descobrir o ponto exato que antecede a ruptura das instituições.
A desfiguração do pacote anticorrupção numa emboscada contra o intresse público que os deputados executaram de madrugada deixou o saco nacional perto do limite. Ao adicionar às propostas que visavam perseguir criminosos uma emenda que intimida os agentes públicos que combatem o crime, a Câmara levou a desfaçatez às fronteiras do paroxismo. Alguns hálitos a mais e a coisa explode.
"Pode-se tentar calar o juiz, mas nunca se conseguiu, nem se conseguirá, calar a Justiça", escreveu, em nota oficial, a ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal. A "lei da intimidação" foi o "golpe mais forte desferido contra a Lava Jato em toda a sua história", lamentou o procurador Deltan Dellagnol. "Nossa proposta é renunciar coletivamente" à operação se esse ataque for sancionado pelo presidente da República, ameaçou o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima.
Exercendo impunemente a presidência do Senado como se nada tivesse sido descoberto sobre ele, Renan Calheiros levou os lábios ao bico do balão para soprar um pouco mais. Disse que o pacote anticorrupção teve dos deputados o tratamento que mereceu. As medidas só poderiam ser adotadas "no fascismo", afirmou, antes de retomar sua cruzada pela aprovação de uma lei para imprensar juízes que imprensam os corruptos (assista abaixo).
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Protagonista de 12 processos judiciais, Renan dá lições de ética ao país a poucas horas do julgamento em que o Supremo deve enviá-lo, nesta quinta-feira, para o banco dos réus. O senador deve responder a uma ação penal sobre o recebimento de propinas de uma empreiteira para pagar pensão da filha que teve fora do casamento. O balão ficará ainda mais cheio se a banda muda do Congresso continuar aceitando em silêncio a anomalia de ser comandada pelo inaceitável.
A essa altura, Michel Temer deveria nomear para sua equipe uma criança de cinco anos, dessas que adoram soprar balões em festas infantis. Ouvindo-a sempre que tiver que decidir sobre a sanção ou veto de projetos aprovados no Congresso, o presidente talvez evite que o balão estoure na sua cara. Não convém encher mais o saco.
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